Leclerc perdeu 1,4 segundos por volta no GP Hungria com um misterioso problema no chassis

Mesmo depois de Charles Leclerc arrancar na pole position (em condições muito específicas) no sábado, a expectativa de uma vitória da McLaren no Grande Prémio da Hungria permanecia. O início da corrida criou a possibilidade da Ferrari vencer pela primeira vez na F1 em 2025, mas as esperanças despenharam-se nas últimas 30 voltas, e Leclerc acabou a corrida quase 40 segundos atrás de Lando Norris, o vencedor.
“Isto é tão incrivelmente frustrante. Perdemos toda a competitividade. Vocês só têm de me ouvir, eu teria encontrado uma forma diferente de gerir esses problemas”, proclamou o monegasco da Ferrari, na volta 53 de 70, acrescentando que “agora é simplesmente impossível de conduzir” e seria “um milagre acabarmos no pódio”.
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O desespero de Leclerc era tal que a transcrição da mensagem para a equipa quase não cabia nos ecrãs da transmissão televisiva. Mas o piloto estava a falar (já desde a primeira troca de pneus) de um ajuste na asa dianteira — que, afinal, não era o culpado do descalabro que acontecia ao Ferrari. Esse era um misterioso “problema” no chassis.
“Algo se partiu do lado do chassis, e até pensámos que não íamos conseguir acabar a corrida”, disse Frédéric Vasseur, o diretor da equipa, aos jornalistas, ainda sem saber, logo após a corrida, “especificamente o que aconteceu”.
Seja qual for a causa, é provável que obrigue a uma investigação aprofundada em Maranello. As contas da Renascença, com base nos dados disponíveis sobre a corrida, mostram que Charles Leclerc perdeu, em média, 1,4 segundos por volta para Oscar Piastri após a última troca de pneus.
Ao todo, Leclerc perdeu 38,5 segundos para Piastri, 31,7 segundos para Lando Norris e 26,8 segundos para George Russell entre a volta 42 e a volta 70 (o final da corrida). As contas excluem as voltas afetadas por idas às boxes.
Curiosamente, a volta mais rápida de Charles Leclerc durante toda a corrida foi na volta 47. O tempo de 1:20.440 é apenas o oitavo mais rápido de toda a corrida; naquela volta, significou uma perda de 0,774 segundos para Oscar Piastri, 0,082 segundos para Lando Norris, e 0,809 segundos para George Russell.
Depois disso, Leclerc raramente perdeu menos de um segundo por volta para a dupla da McLaren — e o mesmo aconteceu mal foi ultrapassado pelo Mercedes de Russell. Tudo isto depois de mostrar velocidade suficiente para aguentar Piastri durante mais de metade da corrida.
Aposta arriscada da Ferrari?
Os dados de telemetria disponíveis em sites como o GP Tempo mostram que o problema não era nas retas — ao contrário de outras corridas, em que a Ferrari obrigou os pilotos a levantar o pé bem antes da zona de travagem para evitar que o fundo do carro raspasse demasiado no asfalto e não cumprisse a espessura mínima das regras, o SF-25 chegava ao fim da reta com 10 km/h a mais que o McLaren. O que é visível é uma perda de velocidade em curva, com as velocidades mínimas por vezes 10 km/h abaixo da competição direta.
Qual a razão para isto tudo? A primeira teoria a aparecer, do bem-informado jornalista britânico Mark Hughes, aponta para uma aposta da Ferrari numa altura ao solo mais arriscada (ou seja, reduzida), que trouxe benefícios nos ventos cruzados do final da qualificação e do início da corrida, mas que seria preciso gerir durante a corrida para evitar uma nova desqualificação.
A forma de gestão escolhida pela Scuderia terá sido, continua a teoria, aumentar as pressões dos pneus para aumentar a altura do carro ao solo — o que pode ter levado os pneus a sobreaquecer facilmente, e explicaria os tempos por volta inconsistentes de Leclerc na última parte da corrida.
Norris só ganhou tempo a Piastri em 12 voltas
A expectativa geral era que o GP da Hungria voltasse a ser uma corrida em que o ideal era trocar de pneus duas vezes. E teria sido, em condições normais — mas Charles Leclerc atirou essas condições janela fora com a pole position no sábado.
A presença e resistência do Ferrari na frente da corrida, depois de um arranque menos bom dos McLaren e de Oscar Piastri não conseguir fugir ao ‘ar sujo’ (com turbulência) provocado por Leclerc, alterou as regras do jogo. Isso tornou-se visível assim que um McLaren circulou em ‘ar limpo’ — sem carros à vista por umas centenas de metros.
Por resultado da estratégia e da incapacidade também de Lando Norris ultrapassar um carro, o Mercedes de Russell, seria esse McLaren, o menos bem colocado, a ter esse privilégio. Com a equipa laranja papaia a ter de adaptar a estratégia de Piastri à necessidade de derrotar Leclerc, o jovem australiano apenas jogou as cartas como queria na segunda ida às boxes, quando já era tarde demais para derrotar o colega de equipa.
Do outro lado, Norris aceitou a sugestão da McLaren de mudar para apenas uma paragem — o próprio respondeu que não tinha nada a perder —, logo após Russell ir às boxes pela primeira vez. Apesar de não ganhar tempo entre esse momento e a troca para pneus duros na volta 32, o britânico foi consistente nas voltas e perdeu pouco mais de nove segundos para Piastri. Mas ainda havia dúvidas sobre o quão exequível era parar apenas uma vez — poucas voltas antes da escolha, o próprio Norris alertava que estava a ficar sem aderência (suficiente para manter o andamento, entenda-se).
Foi a seguir que Norris venceu a corrida. Depois de ir às boxes, ganhou 8,7 segundos a Piastri em 12 voltas — fazendo sucessivamente a volta mais rápida da corrida por cinco vezes, das voltas 35 a 39 —, assegurando 12 segundos de liderança sobre o colega de equipa quando este foi novamente às boxes.
Em conjunto com os cerca de 20 segundos poupados ao evitar a segunda troca de pneus, e com a vantagem de prejudicar Piastri nas curvas e contracurvas do Hungaroring com a turbulência causada pelo seu carro, a margem foi suficiente para colocar o britânico de 25 anos a controlar a liderança da corrida.
Norris apenas teve de saber fechar a porta da primeira curva quando era preciso, e não repetir erros da corrida anterior. Piastri ficou a poucos milímetros de assegurar que os dois saíam de Budapeste com zero pontos, provavelmente frustrado por se ver em segundo apesar de ser o McLaren mais rápido na qualificação e corrida. O toque fatídico não aconteceu, e Norris viu o esforço de conversão de uma oportunidade sortuda ser recompensado.
“Há tantas curvas onde se perde o contacto, e depois as curvas longas no fim da volta — que, quando estás atrás de outro carro, simplesmente mata a tua carga aerodinâmica”, disse Piastri depois da corrida. A seguir, diagnosticou a F1 moderna: “Chegar a seis ou sete décimas é possível. Mas precisaria de ter pneus macios novos para ultrapassar depois disso“. Tradução? Se passar carros de outras equipas já não é fácil, muito menos é ultrapassar um carro igual, mesmo com grandes diferenças nos pneus.
A Fórmula 1 regressa a 29, 30 e 31 de agosto, com o Grande Prémio dos Países Baixos, em Zandvoort. Com nove pontos a separar Oscar Piastri de Lando Norris, está tudo por decidir.