Vogal demitido da Metro Mondego diz que decisão ocorreu na pior altura

Os dois vogais demitidos da Metro Mondego por decisão do Governo mostraram-se esta quarta-feira surpreendidos com a decisão, com um dos administradores substituído a afirmar que a substituição não poderia ocorrer em pior altura face à preparação da operação comercial.

Eduardo Barata e Teresa Jorge foram demitidos e substituídos dos cargos de administradores executivos da Metro Mondego, por proposta do Estado (que é acionista maioritário da empresa e que manteve o atual presidente do conselho de administração), na assembleia geral que decorreu na terça-feira e que mereceu o voto contra dos municípios de Miranda do Corvo e da Lousã.

Contactados pela agência Lusa, os dois vogais mostraram-se surpreendidos com a decisão de substituição antes do final do mandato (31 de dezembro), referindo que não lhes foi apresentada qualquer justificação por parte da tutela.

Apenas tiveram conhecimento da decisão aquando da convocatória da assembleia geral, em agosto.

Para Eduardo Barata, seria “difícil escolher uma fase pior [para substituir os vogais]”, dando nota das “décadas de gestação” que viveu o Sistema de Mobilidade do Mondego (SMM) — implicou o fecho do ramal da Lousã há mais de 20 anos.

“Estamos a caminho da maternidade com um bebé que teve uma gravidez de risco que se prolongou por décadas e, neste momento, estamos a agredir esse bebé. Estamos a por em causa a saúde do próprio projeto”, disse à Lusa o vogal demitido.

Questionado pela Lusa se encontra algo que justifique a decisão do Governo, Eduardo Barata admitiu dificuldade em apontar para uma justificação, mas confia que quem tomou a decisão “estará certamente consciente das suas consequências”.

“Se as pessoas que agora foram nomeadas tiverem confiança e estatuto junto do Governo central, isso poderá ser muito positivo para resolver alguns dos dossiês mais complexos que ficam por resolver”, notou.

Os dois administradores foram substituídos numa altura em que o SMM arrancou com uma operação preliminar em cinco quilómetros do seu troço na cidade de Coimbra e que prepara o arranque da operação comercial até ao final do ano entre Serpins (Lousã) e Portagem (Coimbra).

Na ótica de Eduardo Barata, havia um conjunto de procedimentos e processos complexos associados ao arranque da operação que estavam “com uma dinâmica muito acentuada nos últimos meses” e que neste momento ficam “um bocadinho mais desamparados”.

Para o vogal demitido, isso irá implicar “um esforço acrescido de alguém que já estava sobrecarregado”, o presidente da Metro Mondego, João Marrana.

“Independentemente da competência das pessoas que entram e que desejo que tenham a maior sorte do mundo […], eles vão precisar de um tempo considerável até conseguirem começar a contribuir positivamente para o projeto”, disse.

Eduardo Barata salientou ainda que sempre sentiu apoio da tutela, dando nota de uma relação “excecional” com o gabinete do ministro das Infraestruturas e Habitação.

Contactada pela agência Lusa, Teresa Jorge afirmou que a decisão a apanhou de surpresa.

Questionada sobre se a mudança nesta altura terá algum impacto no desenvolvimento do projeto, a vogal escusou-se a tecer comentários.

O presidente da Metro Mondego recusou-se a comentar a decisão.

Eduardo Barata e Teresa Jorge, ambos com ligações ao PS, são substituídos por Ricardo Cândido, chefe de divisão na Câmara da Figueira da Foz, e pela docente no Instituto Superior de Engenharia de Coimbra (ISEC), Cristina Agreira, ambos membros do executivo da Junta de Freguesia de Santo António dos Olivais, liderada pela coligação Juntos Somos Coimbra (PSD/CDS/NC/PPM/A/R/V), que conquistou também a Câmara de Coimbra.

Na terça-feira, o Ministério das Infraestruturas e Habitação não avançou com qualquer esclarecimento sobre a mudança.

A Metro Mondego gere a operação do SMM, que irá servir os concelhos de Coimbra, Miranda do Corvo e Lousã, com autocarros elétricos articulados a circular em canal dedicado.

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Carris garante que “têm sido escrupulosamente cumpridos os programas de manutenção” e diz que última inspeção foi feita em 2024

Acompanhe o nosso liveblog sobre o acidente com o Elevador da Glória.

A Carris lamentou a existência de vítimas no descarrilamento do elevador da Glória, em Lisboa, que fez esta quarta-feira 15 mortos e 18 feridos, e fez saber que abriu um inquérito para apurar as causas do acidente.

“Na sequência do acidente ocorrido esta tarde com o ascensor da Glória, a Carris lamenta a existência de vítimas e está a acompanhar a situação”, revelou a empresa que gere o elevador da Glória numa nota enviada à Lusa.

A Carris disse ainda que “foram realizados e respeitados todos os protocolos de manutenção” e que a última inspeção foi realizada no ano passado.

De acordo com a empresa, a manutenção geral que ocorre a cada quatro anos, ocorreu em 2022 e a última reparação intercalar, que é concretizada de dois em dois anos, foi feita em 2024.

“Têm sido escrupulosamente cumpridos os programas de manutenção mensal, semanal e a inspeção diária”, afirmou.

A empresa disse ainda que “abriu de imediato um inquérito em conjunto com as autoridades para apurar as reais causas deste acidente”.

O elevador da Glória, em Lisboa, descarrilou esta quarta-feira, pelas 18h04, na Calçada da Glória. O acidente fez 15 mortos e 23 feridos. O Governo decretou um dia de luto nacional, nesta quinta-feira, e a Câmara de Lisboa decretou três.

O elevador da Glória é gerido pela Carris, liga os Restauradores ao Jardim de São Pedro de Alcântara, no Bairro Alto, num percurso de cerca de 265 metros e é muito procurado por turistas.

FPF associa-se à dor e consternação provocada pelo descarrilamento

Acompanhe o nosso liveblog sobre o acidente com o elevador da Glória 

A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) lamentou o acidente ocorrido hoje no Elevador da Glória, em Lisboa, que provocou 15 mortos e 18 feridos.

O organismo liderado por Pedro Proença emitiu um comunicado em que se “associa à dor e consternação provocadas pelo trágico acidente ocorrido em Lisboa, no Elevador da Glória”.

“Os nossos pensamentos estão com os familiares das vítimas e com todos os afetados por esta tragédia“, rematou a FPF.

O elevador da Glória, em Lisboa, descarrilou esta quarta-feira, pelas 18h04, na Calçada da Glória. O acidente fez 15 mortos e 23 feridos. O Governo decretou um dia de luto nacional, nesta quinta-feira, e a Câmara de Lisboa decretou três.

Esta atração turística da capital portuguesa gerida pela Carris liga os Restauradores ao Jardim de São Pedro de Alcântara, no Bairro Alto, num percurso de cerca de 265 metros, com uma inclinação de 17%. Inaugurado em 24 de outubro de 1885, ganhou, há pouco mais de 20 anos, em 2002, o estatuto de Monumento Nacional.

Benfica, o FC Porto e o Sporting associam-se às homenagens às vítimas do acidente no Elevador da Glória

“O FC Porto manifesta profunda consternação perante o trágico acidente ocorrido em Lisboa, com o Elevador da Glória. Neste momento de tristeza e dor, enviamos uma mensagem de solidariedade e conforto para com a família e amigos de todas as vítimas desta tragédia”, escreveram os ‘dragões’, na rede social X.

O elevador da Glória, em Lisboa, descarrilou esta quarta-feira, pelas 18h04, na Calçada da Glória. O acidente fez 15 mortos e 23 feridos. O Governo decretou um dia de luto nacional, nesta quinta-feira, e a Câmara de Lisboa decretou três.

Esta atração turística da capital portuguesa gerida pela Carris liga os Restauradores ao Jardim de São Pedro de Alcântara, no Bairro Alto, num percurso de cerca de 265 metros, com uma inclinação de 17%. Inaugurado em 24 de outubro de 1885, ganhou, há pouco mais de 20 anos, em 2002, o estatuto de Monumento Nacional.

Primeira vítima mortal do acidente do Elevador da Glória identificada. Trata-se do guarda-freio da composição

O ator André Costa recordou também o guarda-freio, que conheceu em 2023 no decurso da gravação de uma reportagem para o programa da SIC “Alô Portugal”

“Há cerca de dois anos, tive a sorte de o conhecer, quando de forma generosa e simpática aceitou conversar comigo, sem qualquer aviso prévio”, escreve o ator, numa publicação acompanhada de um excerto dessa peça televisiva.

Sindicato contra “outsourcing” na manutenção do Elevador da Glória

A manutenção do Elevador da Glória, operado pela Carris, não deveria ser feita por empresas externas, defende o Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos de Portugal (STRUP).

“Defendemos que a manutenção deveria ser feita pela própria empresa [a Carris], até para ser mais fácil a fiscalização”, diz à Renascença Anabela Carvalheira, do STRUP, após o acidente que esta quarta-feira provocou 15 mortos e 23 feridos.

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Para a sindicalista “a exigência colocada sobre os trabalhadores da própria empresa não é colocada sobre os trabalhadores que estão em outsourcing ou que pertencem a outra empresa [externa]”.

Vídeo. Descarrilamento do elevador da Glória em Lisboa faz 15 vítimas mortais e 18 feridos

O presidente do conselho de administração da Carris disse, esta quarta-feira à noite, que a manutenção do Elevador da Glória é assegurada há 14 anos por uma empresa externa. Pedro de Brito Bogas sublinha que o “protocolo de manutenção foi escrupulosamente respeitado” no elevador da Glória.

Anabela Carvalheira lamenta a opção, porque “depois, quando acontece algum problema, é o serviço público de transportes que é posto em causa”.

O Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos de Portugal defende também maior fiscalização nas operações de manutenção feitas por empresas externas, após o acidente desta quarta-feira.

Anabela Carvalheira pede que sejam apuradas as causas e as responsabilidades de forma rápida após o desastre no Elevador da Glória.

“Não conseguimos nesta altura afirmar com certeza que isto é uma questão de falhas mecânicas ou de falta de manutenção. Uma coisa nós sabemos, infelizmente, as empresas têm uma prioridade: gastar o menos dinheiro possível”, afirma a sindicalista.

“Não importa fazer julgamentos precipitados, importa assumir e assacar responsabilidades e verificar o que efetivamente falhou”, sublinha Anabela Carvalheira.

Para a dirigente do STRUP, “o mais importante nesta altura é averiguar as reais causas do acidente, para não se repetir” e, depois, terão de ser assumidas responsabilidades.

Estudo deteta a praga de insetos mais antiga da história da Terra

Fósseis de plantas datados de há 295 milhões de anos mostram os túneis de alimentação mais antigos de larvas de insetos no interior das folhas, juntamente com os depósitos de ovos associados.

Um grupo de paleontólogos, incluindo investigadores do Museu de História Natural de Berlim (MfN), descreveu esta descoberta, devido à sua prevalência nas plantas estudadas, como a praga de insetos mais antiga da história da Terra.

As descobertas mostram que este comportamento altamente especializado das larvas de insetos já existia cerca de 40 milhões de anos antes do que se pensava.

Viver dentro do tecido vegetal oferece muitas vantagens, como a proteção contra predadores, desidratação e influências ambientais prejudiciais.

Além disso, as larvas têm um fornecimento alimentar quase inesgotável, relata o MfN em comunicado citado pela agência Europa Press.

Atualmente, as minas de folhas são produzidas exclusivamente por insetos como os escaravelhos, moscas, vespas e borboletas, que sofrem uma transformação completa (metamorfose) e, por isso, são conhecidos como insetos holometábolos.

São altamente adaptáveis e, ao longo da evolução, desenvolveram larvas esbeltas, semelhantes a vermes, sem apêndices corporais, perfeitamente adaptadas à vida dentro do tecido vegetal.

Até agora, não estava claro quando é que esta estratégia bem-sucedida surgiu entre os insetos.

A evidência fiável mais antiga de minas de folhas até à data remonta ao Triássico, no início do Mesozóico.

Utilizando métodos de investigação modernos, uma equipa de cientistas dos Museus de História Natural de Chemnitz, Berlim, Münster e Osnabrück, da TU Bergakademie Freiberg e da Universidade Martin Luther de Halle-Wittenberg conseguiu demonstrar que as minas de folhas existiam mais de 40 milhões de anos antes do que se pensava. O artigo foi publicado na revista Scientific Reports.

Os investigadores tiveram acesso às extensas coleções paleobotânicas dos Museus de História Natural de Berlim, Schleusingen e da Universidade de Mineração e Tecnologia de Freiberg, que se revelaram verdadeiros tesouros para a ciência, pois estas coleções continham numerosos espécimes excecionalmente bem preservados de vestígios alimentares de Asteronomus maeandriformis em folhas da samambaia Autunia conferta, provenientes de depósitos com aproximadamente 295 milhões de anos do período Pérmico na pequena e antiga área de mineração de carvão de Crock, Turíngia, Alemanha.

Os fósseis de plantas perfeitamente preservados permitiram a conclusão inequívoca de que as larvas de insetos criaram os túneis de alimentação protegidos no interior das folhas.

Além disso, foi possível identificar depósitos de ovos associados aos túneis de alimentação, que em alguns casos continham até restos de ovos de insetos.

No total, mais de 80% de todas as plantas Autunia de Crock foram infestadas por minas foliares, o que pode ser corretamente descrito como a infestação de insetos mais antiga da história da Terra.

A razão exata pela qual as plantas Autunia no sítio arqueológico de Crock sofreram uma infestação tão intensa permanece um mistério.

No entanto, o fenómeno ocorreu durante um período de alterações globais, durante o qual os ecossistemas terrestres tropicais secaram gradualmente.

Praia fluvial de Mirandela desaconselhada a banhos devido a contaminação

São desaconselhados banhos na praia fluvial Albino Mendo, em Mirandela, devido a “valores elevados de enterecocos intestinais e/ou e-coli”, divulgou, quarta-frira, a Agência Portuguesa do Ambiente, no site oficial.

O município de Mirandela esclareceu, à Lusa, que “foram já afixados no local os respetivos avisos de desaconselhamento, medida que se manterá até que novas análises confirmem a reposição da qualidade da água”.

Adiantou ainda que já foi feita uma contra-análise e os resultados serão conhecidos “na sexta-feira ou na próxima segunda-feira”. “O Município, em articulação com as entidades competentes, encontra-se a averiguar as causas da contaminação”, assegurou.

Segundo o município, desde junho, têm vindo a ser feitas análises à água, pela própria câmara municipal e pela APA. Os relatórios divulgados no site do Sistema Nacional de Informação de Recurso Hídricos, mostra que os valores têm estado dentro dos parâmetros e que, desde 2016, que a qualidade da água nesta praia fluvial é “excelente”. .

A praia fluvial Albino Mendo fica no centro da cidade de Mirandela e tem o Galardão de Bandeira Azul pela qualidade da água, limpeza e gestão ambiental. Esta distinção é atribuída consoante candidatura e o cumprimento de vários critérios. Tem a durabilidade de uma época balnear.

Pornografia

Alguém, um dia, fará o filme e parecerá irreal, mal contado: a história de um primeiro-ministro, outrora todo-poderoso, que termina a gritar com um cão que passa, os pombos, as árvores, as pedras da calçada, e já nada lhe obedece. Nada lhe responde.

No Brasil, o julgamento de Jair Bolsonaro divide o país; nos Estados Unidos, só a dimensão da vitória eleitoral teve o discutível condão de fazer esquecer os múltiplos processos envolvendo Donald Trump. Em Portugal, o julgamento de um antigo chefe de governo acusado de corrupção parece já não motivar o apoio ou escândalo sequer daquele saudoso movimento cívico “José Sócrates Sempre” (lembram-se?). Coisas talvez de nação velha e melancólica – como não lhe achar uma estranha beleza?

Será do timing? Do tempo passado sobre os factos? José Sócrates costumava suscitar toda a espécie de paixão. Nunca era discutido em debates mornos; sempre em lume alto, entre críticos ferozes e fanáticos fiéis. Deu a primeira maioria absoluta da história ao Partido Socialista, foi bandeira de uma suposta modernidade do país e da esquerda democrática para o século XXI, alimentou um culto à liderança que colocou o seu nome acima do do partido. Fez e desfez administrações de bancos, das maiores empresas do país, direcções de rádios, jornais e televisões. Teve a Procuradoria-Geral da República e o Supremo Tribunal a não verem mal algum nas suspeitas que já então o envolviam, e meio Portugal, entre partido, simpatizantes e comentadores, durante anos em respeitoso silêncio ou a ir ainda ao beija-mão à cadeia, quem sabe à espera do quê. Até ao dia em que alguém decretou o fim do luto, ou da esperança numa qualquer reviravolta de filme. E um a um, antigos amigos, aliados e devotos começaram a demarcar-se, a desaparecer, até a arriscar uma crítica em público, a fingir que o outrora magnético líder não passava afinal de um parente tóxico muito afastado, com quem mal se tinham chegado a cruzar.

“Pornografia”, acusou ontem no tribunal. O que o procurador e o tribunal queriam era pornografia; ouvir mais uma escuta, fazer mais uma pergunta indecente, devassar-lhe mais a vida privada. A pausa para as férias de Verão nada mudou. Tentou talvez aparecer um pouco mais sorridente, ter mais três segundos de calma e simpatia para as câmaras de televisão, mas, simplesmente, não consegue. Revolta-se contra os jornalistas, contra o procurador, contra a juíza – no outro dia, até contra o sol que estava de frente. Mas quem é toda esta gente e o que querem dele? Porque é que querem saber de onde é que veio o dinheiro? Com quem falou quando era primeiro-ministro? E quando deixou de ser? E com que empresas reuniu? E com quem jantou? “Fui a casa de Ricardo Salgado, mas não jantei” é o novo “fumei, mas não inalei” versão política portuguesa. Ele não compreende, genuinamente. É um homem contra o mundo. Nem com o melhor amigo, que para tudo lhe emprestou dinheiro e que está a ser julgado no mesmo caso e que talvez lhe continue a emprestar, porque, doutro modo, não se percebe como conseguiria ele pagar tantos recursos, incidentes e anos de trabalho dos advogados, chega ao tribunal. Mas será que foi ele que mudou?

Houve um tempo em que procuradores e juízes decidiram a favor de José Sócrates. Em que banqueiros e grandes empresários gostavam de aparecer ao seu lado. Em que jornalistas e câmaras de televisão disseram e mostraram o que José Sócrates queria. José Sócrates sempre gostou de gritar e ser obedecido – e sente agora como verdadeiramente cruel e incompreensível que lhe tenha sido tirado esse poder, que já não lhe obedeçam; que, pelo contrário, o queiram obrigar a ele a cumprir ordens, respeitar o tribunal, não sair sem pedir autorização, responder ao que lhe é perguntado. Com que empresas reuniu? Com quem falou ao telefone? Que banqueiros visitou? Era o que faltava. Indecência. Pornografia. Tudo vida privada ou estritas missões de um ex-primeiro-ministro. O que vocês devem perguntar é o que eu vos disser que devem perguntar.

E no fim do dia, paira no ar a dúvida desconfortável: como teria sido se a justiça tivesse sido rápida? Se o julgamento tivesse ocorrido ainda sob o calor dos acontecimentos, no tempo em que os fiéis ainda não tinham corrido a pôr-se a salvo, quando o julgamento de um ex-primeiro-ministro teria, como em princípio deveria, feito parar o país? Ou haverá, afinal, alguma espécie de justiça perversa na lentidão?

Pornografia, disse ele. E de tão óbvia, repetida, desajustada, qualquer dia já ninguém pára sequer para olhar.

O talentoso Prof. Marcelo

Por estes dias, aquela estranha figura que habita o Palácio de Belém, provavelmente com o cérebro ainda escaldado pelo sol de Verão, resolveu aparecer na “universidade” da JSD com duas ideias: a primeira, uma boa notícia, é que esta seria a sua última aparição naquele evento anual uma vez que, explicou ele, após terminar o mandato presidencial, “não fica bem andar a comentar políticos e partidos políticos em eventos partidários”. Extraordinariamente, à ideia do Prof. Marcelo nunca chegou a noção que pior que um comentador ex-presidente será um presidente comentador. Ou seja, o recato e o dever de neutralidade próprios das funções de Presidente da República, segundo o próprio, forçam o Prof. Marcelo a arredar-se de aparecer nos eventos partidários da JSD, mas apenas agora que cessa essas mesmas funções. Já antes, enquanto as ocupou, e ocupa, nunca lhe ocorreu qualquer particular limitação decorrente das responsabilidades próprias do cargo — é assim como se o monge que fez um voto de silêncio, e que nunca passou um dia sem falar na vida, resolva calar-se no momento em que abandona o voto e o mosteiro.

Nada de novo, é certo, pois que trapalhada, incoerência, desconexão, contradição e dissonância cognitiva serão as grandes características de um político famoso por pensar uma coisa e o seu contrário ao mesmo tempo. Infelizmente, uma vez que já praticamente ninguém liga pevide, tremoço ou amendoim ao Prof. Marcelo, este, na ânsia de ganhar protagonismo e ainda saborear um pouco daquela exposição mediática que tanto lhe afaga o ego e satisfaz a sua necessidade infantil de ser o centro das atenções, vê-se forçado a progressivamente tornar-se mais arrojado, polémico, panfletário, nas suas confabulações. Vai daí e nesta ocasião, na impossibilidade física de fazer o pino, a espargata, ou qualquer outra cabriola, ocorreu ao senhor balbuciar que o presidente dos EUA é, e passo a citar, “um agente russo”. Ora, se impressiona a leviandade com que o chefe de estado português se refere ao líder político, não apenas da maior potência mundial, mas do mais importante aliado militar do país, algo que porventura poderá ser sinal revelador de alguma forma de diminuição intelectual, médica ou psicológica para exercer as suas funções — até que ponto não deveríamos ter o direito de saber se o chefe de estado se encontra na inteira posse das suas faculdades? —, por outro lado não deixa também de ser bastante revelador a substância da afirmação em causa.

Aqui, desde logo, importa perceber que a ideia de Donald Trump ser um agente russo não é propriamente novidade. Pelo contrário, esta acusação — mais correcto seria até chamar-lhe narrativa — nasceu em 2016, durante a recta final da campanha para as presidenciais norte-americanas pelo que, para quem siga com um mínimo de capacidade crítica a política norte-americana, esta questão é tudo menos surpresa. Primeiro, logo em 16, todo o mainstream mediático se juntou para chamar Trump de agente russo; depois, durante parte do primeiro, e inesperado, mandato Trump na Casa Branca (2016-20), baseado no célebre “dossier Steel”, muito se escreveu e falou nos EUA a favor e contra essas alegações, incluindo durante um (de dois) processos de “impeachment”, baseado, precisamente, na acusação de “conluio” e de “interferência” do governo russo nas eleições de 16, alegadamente para eleger Trump.

Mais tarde, o “impeachment” foi derrotado e, depois, já nos finalmentes de toda a trapalhada do mandato de Biden (2020-24), a historieta “Trump é um agente russo” acabou desacreditada, em particular quando foi tornado público que o famigerado dossier Steel — a base de toda a questão — teria sido uma fabricação elaborada entre Junho e Dezembro de 2016 pela campanha Clinton com o apoio da Casa Branca cessante, inclusive, do próprio Barack Obama ainda enquanto presidente. Curiosamente, é nesse momento, em finais de 2024, com oito anos de atraso, que malquistados enraivecidos anti-Trump do comentariado e jornalismo português começam a lançar essa questão na comunicação social nacional com o intuito de explicar por que razão o recém-eleito presidente norte-americano iria ceder em toda a linha a Putin, acabar com a NATO e destruir o Ocidente. Já no mundo real, nos EUA, desde os últimos meses, uma das questões que Trump tem lançado com frequência é precisamente a necessidade de se apurarem todas as responsabilidades na elaboração do que ele chama “Russia Hoax”, inclusive acenando com a possibilidade de procedimentos criminais contra Clinton e Obama.

Ora, esta questão não é de somenos. Se é certo que a partidarite, o viés e a alienação mental própria de grande parte do jornalismo português consegue fazer passar muita da narrativa do Partido Democrata estado-unidense como sendo “informação”, bem como a contra-narrativa do Partido Republicano como “desinformação”, independentemente de onde nos queiramos posicionar nesta matéria, caberia no mínimo ao chefe de estado português conhecer ambas argumentações dos principais agentes no maior palco político internacional — e abster-se de comentar. No final, vá lá, a coisa até acabou relevada dada a insignificância do país, a natureza não-executiva das funções da presidência e, obviamente, o carácter exótico, assim ao estilo de catatua política, verbalmente incontinente, deslinguada e mentalmente destravada, próprio da personagem em causa.

Agora, pior, é o que se revela por trás: o Prof. Marcelo desconhece de todo o que se passa nos EUA. Não obstante, porque viu duas ou três reportagens do alucinado Costa Ribas na SIC e quatro ou cinco “clippings” de “jornais de referência” internacionais, todos eles normalmente alinhados com a narrativa do partido democrata e fortemente críticos de Trump, e logo se imagina o Prof. Marcelo profundamente informado sobre a situação. Tão informado está, aliás, que reproduz acéfala e acriticamente o principal ponto de propaganda política do Partido Democrata norte-americano entre 16 e 24 — algo repetido até à exaustão por todo o lado durante oito anos! — como sendo uma incontestável verdade, inclusive uma novidade, algo que resolveu vender como uma espécie de confidência de uma personalidade política que, dominando o palco internacional, desce ali à “universidade” da JSD, junto a uma pequena audiência de jovens, para revelar aquilo que mais ninguém sabe — e que a juventude política autóctone anseia por aprender.

Haverá cenário mais patético do que este? O Prof. Marcelo não apenas comprova que expele em público aquilo que emprenha pelas orelhas, não sendo diferente de qualquer incauto que, imaginando moscambilheiros estilo Costa Ribas como sendo fontes de “informação”, repete no café, ufano, de mão no peito e dedo em riste, aquilo que ouviu no Telejornal convencido de estar na crista da análise geo-política internacional. Ah, e assim encontramos o Prof. Marcelo, babão, cacheado, perante uma audiência sequiosa da sua sapiência, imaginando-se a oferecer um furo, uma cacha, uma bomba de novidade, de análise, de conhecimento sensacional — Trump é um agente russo! —, quando na realidade apenas regurgita aquilo que anda há oito anos a ser vendido por todo o lado como uma espécie de “narrativa consensual” no aparelho mediático do Partido Democrata dos EUA. Incrivelmente, não só a coisa chegou com quase uma década de atraso às orelhas do Prof. como ainda lhe escapa que tudo tenha, entretanto, sido em larguíssima medida cabalmente desmentido, que se tenha, inclusive, por outras razões, transformado num importante ponto de contenda política e judicial cujo desenlace poderá vir mesmo a ser um dos pontos mais críticos e polémicos dos próximos anos nos EUA. Pobre Prof. Marcelo, alienado da realidade, ignorante do que se passa, a tocar o disco de há oito anos atrás, ora aí está o exemplo mais puro e perfeito do crónico arrabaldismo intelectual e político nacional.

Mais uma vez, nada disto é novidade. Aliás, se há uma figurinha que encarna na perfeição o célebre atraso e provincianismo português de que Pessoa falava, essa personagem bem pode ser o Prof. Marcelo. Poltrão, palrando sempre de cuspo colado, quando não se babando, fala permanentemente do que não sabe, achando-se o maior peixe do aquário lusitano, bem como, apesar de não articular uma palavra de inglês reconhecível, um iluminado que compreende, descortina e explica o mundo inteiro. Só que não. Aliás, esse é o drama do dito provincianismo — tomar a parte pelo todo e achar que conhecer o aquário equivale a conhecer o Oceano. Como comprovam estes últimos comentários, quer os primeiros desprovidos de sentido, quer os segundos fecundos em patética alienação mental, nem o mundo, nem a Europa, nem o país, nem nada, Marcelo não compreende verdadeiramente nada. Depois, porque, tal como na aula da “universidade” de Verão dos jotas, todo o seu intento é o de convencer as pessoas que já compreendeu tudo, nunca corrige, nunca evolui, acabando nunca apreendendo.

Não obstante, e mesmo famoso por ser reiteradamente falso, por vezes ostensivamente mentiroso, sempre manipulador e alcoviteiro, deste poço imenso de defeitos públicos saiu um verdadeiro talento que, disfarçando a sua douta e provinciana ignorância, lhe permitiu o sucesso — o actor que dissimula. É daí, desse fingimento que lhe é natural, que Marcelo se fez popular, primeiro, e até por legado familiar, na elite própria dos “meios que contam”, depois, mais tarde, culminando no seu maior papel, o grande doutrinador dominical da actualidade lusitana que tudo analisa, tudo comenta, desde a pantomina política até à novela da noite, dos livros que recomenda ao quilo, mas não lê, aos concertos e músicas que não ouve, dos recados para o A ou o B aos sub-reptícios avanços dos seus próprios interesses e agendas, de tudo e de nada — em suma, tornou-se no grande mestre de cerimónias do circo político português.

A fórmula do sucesso para o estrelato do Prof. Marcelo foi a de sempre: seja como comentador, jornalista, político, ou académico, em tudo se fez vendendo uma imagem daquilo que não era — como comentador, fingindo a independência neutral do analista sem apostas pessoais metidas no jogo que analisa; como jornalista, vendendo o acesso político; como político, o acesso mediático; e, finalmente, como académico, além de encenar espectáculo em aulas para centenas de alunos recém-entrados na Universidade, inventando o mito do homem dos sete ofícios que não dorme e escreve, com as duas mãos em simultâneo, tratados, obras, pareceres, compilações. Tudo fogo de vista, naturalmente. Pura simulação, acto de circo como tudo o resto.

Já no mundo real, em nenhuma dessas actividades o Prof. Marcelo foi particularmente brilhante, apenas bem sucedido encarnando com frenético, obsessivo, hiper-activo vigor a personagem do homem brilhante. No final, o talentoso prof. Marcelo, não deixa nada: tal como não escreveu uma obra de referência que tenha um vislumbre de valor em qualquer área, também na política nada lega para além do rebaixar, conspurcar, perverter das suas funções — no caso, fundamentalmente, a de garantir o regular funcionamento das instituições (que abanou constantemente ao vogar do interesse do momento) e fazer cumprir a Constituição (que infringiu reiteradamente como nenhum outro chefe de estado alguma vez o fez).

Foi, portanto, quando finalmente chegou a um cargo da maior relevância que a careca se destapou para todos verem a talentosa fraude que sempre foi o Prof. Marcelo — é que pela primeira vez foi o popular génio chamado, e forçado, a fazer,  a agir, não apenas a fingir, ou dizer, que fazia e agia. Daí, o resultado foi revelar ao mundo o quão fajuto e artificial é todo aquele mundinho parolo que o talentoso prof. Marcelo inventou sobre, e para, si próprio e no qual, por articular com tanto jeito e arte a sua provinciana ignorância ao nível do povo, ao se fazer de génio facilmente compreendido, assim o povo se imaginou tão inteligente quanto ele, levando a que, por tacanhez generalizada, a maioria da população lhe desse o ambicionado voto de confiança — ou seja, por incrível que pareça, foi a coerência entre a sua própria parolice com o dito provincianismo indígena que o fez  imensamente popular.

Tal como é agora também, uma vez desfeita a ilusão do talentoso Prof. Marcelo por cansaço, repetição, exaustão, a sua patética incapacidade de ver o mundo que o torna ridículo. Uma vez revelada a sua verdadeira e trágica pequena dimensão, hoje que se generalizou aquela sensação de que o sábio polímata Marcelo só parece saber do que fala quando aborda assuntos dos quais não percebemos nada, despido perante as câmaras tal como quando fazia gala de trocar de roupa e escovar as partes privadas em frente à TV, desmascarado na sua proverbial e estulta ignorância, torna-se essa personagem que elegemos embaraçante para todos — desde logo quem nele votou e ora se arrepende pleno de vergonha, mas também todos os outros que ainda levam a sério a função institucional do Presidente da República.

No final, fica para a memória aquilo que bem mereceria uma estátua numa rotunda cascalense: a figura grotesca de Marcelo com a sua tolha, à beira da praia, trocando por cuecas os seus célebres calções azuis. Tratando-se do nosso chefe de estado, é nessa pequenina e ridícula figura que não conseguimos deixar também de vislumbrar reflectida a imagem da nossa pequenez enquanto país — e é isso que o torna verdadeiramente insuportável. Daí que nos “meios que contam”, em particular os mediáticos, já há muito que não se fale de outra coisa além das eleições presidenciais de 26: no campo político, social, e mediático, a actual presidência há muito que morreu. Só falta mesmo, para alívio de todos, enterrá-la.

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