As legislativas anuais de 2026


O voto é livre e expresso de forma individual. Os eleitores, quando entram na urna, não sabem como vai votar o vizinho do lado e, muito menos, o país coletivamente. Logo, não votam em maiorias. Votam, simplesmente, num partido. Ou, mais do que isso, num líder. Votam, acima de tudo, em perceções: quem acham que é mais capaz, que os defende melhor ou que lhes trará uma vida melhor.
As eleições de 18 de maio trazem uma circunstância quase única: no espaço de um ano enfrentam-se os mesmíssimos líderes partidários. A grande diferença é que um deles é agora primeiro-ministro e, isso, à partida traz-lhe uma vantagem (até porque teve uma política de aumento de rendimentos). Ao mesmo tempo foi o caso Spinumviva que desencadeou este ato eleitoral e isso, à partida, anula-lhe a vantagem.
Volvido um ano, o mais provável é que quem votou em Montenegro, volte a fazê-lo. Quem votou em Pedro Nuno Santos, idem. O grande quinhão eleitoral seria, então, o Chega. Uma quebra de André Ventura poderia levar a AD e os liberais a crescer no espaço não-socialista e, quem sabe, chegar à tão ambicionada maioria. Mas não é provável que isso vá acontecer. O Chega teria, imagine-se, de perder 28 dos 50 deputados diretamente para estas duas forças, o que não parece ser crível em nenhuma das sondagens. Até não será surpresa para ninguém que, apesar de Arrudas e casos de pedofilia, o Chega venha a crescer no próximo domingo.
Com pequenos ajustes na aritmética parlamentar, é provável que a situação fique muito parecida à que existe atualmente. A repetição da situação atual traz, no entanto, uma agravante. A margem de Pedro Nuno Santos (não, uma derrota não levará José Luís Carneiro para a liderança do PS, como a direita pensa) e de André Ventura (que provou não ter problemas em derrubar um governo de direita) para viabilizar um programa de Governo liderado por Luís Montenegro é pouca. Os dois centraram boa parte da campanha a tentar vender a ideia de que o primeiro-ministro é um mafioso que trafica influências. Teriam, por isso, dificuldade em justificar como permitiriam que alguém tão mau e maldoso continue à frente dos destinos do país.
Nesse mesmo cenário, nem Pedro Nuno Santos nem André Ventura teriam votos para uma alternativa. Por isso, Marcelo Rebelo de Sousa até os podia chamar para tentarem uma solução governativa (individualmente), mas nenhum teria votos para isso. O Presidente também não poderia convocar novas eleições. Se não estivesse em final de mandato podia fazê-lo algures em novembro, mas como sai de Belém em março de 2026 só o futuro chefe de Estado o pode fazer.
A Marcelo e ao país pode, por isso, sobrar um cenário (que, nas sondagens é o mais provável) em que o novo Governo fica com o mesmo líder, mas — por força do chumbo do programa de Governo ou do Orçamento para 2026 — o Executivo fique em gestão até maio de 2026. Claro que André Ventura pode mudar de posição (fá-lo muitas vezes, de forma incoerente, e o seu eleitorado nem tuge, nem muge). Pedro Nuno Santos também pode dar mais um mortal à retaguarda e repetir em 2025 o que fez em 2024 (esperando depois uma vitória do PS em autárquicas para ficar com um novo fôlego). Aí, haverá um Governo AD de plenas funções, mas igualmente com prazo de validade.
Com um resultado idêntico ao de 2024 — mesmo com programa de Governo e orçamento aprovados — o potencial de degradação da situação política é ainda maior. E aí a palavra será do futuro Presidente da República. Mesmo que Gouveia e Melo (e Marques Mendes) não coloquem um orçamento como uma obrigatoriedade para manter um Governo em funções, poderão não ter grande alternativa a avançar para a dissolução da futura Assembleia da República em março de 2026. E isso significaria novas eleições em maio/junho de 2026.
Pode parecer extemporâneo falar de uma eventual futura eleição a seis dias de outra, mas a crispação da campanha adensou as suspeitas de que uma situação política que resulte das eleições de 18 maio que seja similar à de há um ano, tenha um desfecho similar. Ou as sondagens estão enganadas ou é bem provável que, daqui a precisamente um ano, o País seja chamado novamente a eleições. Naquilo que se podem chamar passar a chamar de eleições legislativas anuais de 2026.