Israel anuncia plano de colonatos para “enterrar” ideia de um Estado palestiniano


O ministro das Finanças de Israel, Bezalel Smotrich, anunciou que vai avançar com um projeto de colonato há muito adiado, que dividirá a Cisjordânia e cortará de Jerusalém Oriental — um movimento que o seu gabinete disse que “enterrará” a ideia de um Estado palestiniano.
O governo palestiniano, aliados e grupos de ativistas condenaram o plano, classificando-o como ilegal e afirmando que a fragmentação do território destruiria qualquer proposta de paz para a região apoiada pela comunidade internacional.
No local previsto para o colonato em Maale Adumim, Smotrich afirmou, esta quinta-feira, que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e o Presidente dos EUA, Donald Trump, tinham concordado com a retoma do projeto de desenvolvimento E1, embora não tenha havido confirmação imediata de nenhum dos dois.
“Quem, no mundo, tentar reconhecer hoje um Estado palestiniano receberá a nossa resposta no terreno. Não com documentos, nem com decisões ou declarações, mas com factos. Factos de casas, factos de bairros”, disse Smotrich.
Israel congelou os planos de construção em Maale Adumim em 2012 e novamente em 2020, devido a objeções dos EUA, de aliados europeus e de outras potências que consideravam o projeto uma ameaça a qualquer futuro acordo de paz com os palestinianos.
A medida poderá isolar ainda mais Israel, que já viu alguns dos seus aliados ocidentais condenarem a sua ofensiva militar em Gaza e anunciarem que irão reconhecer um Estado palestiniano.
Os palestinianos receiam que a construção de colonatos na Cisjordânia — que se intensificou acentuadamente desde o ataque do Hamas a Israel em 2023, que desencadeou a guerra em Gaza — lhes retire qualquer hipótese de criar um Estado próprio na região.
Num comunicado intitulado “Enterrar a ideia de um Estado palestiniano”, o porta-voz de Smotrich disse que o ministro aprovou o plano para construir 3.401 casas para colonos israelitas entre um colonato existente na Cisjordânia e Jerusalém.
Em Maale Adumim, Smotrich disse à Reuters que o plano entraria em vigor na quarta-feira, sem especificar o que aconteceria exatamente nesse dia.
Expansão de colonatos “fragmentará ainda mais o território palestiniano”
A organização israelita de direitos humanos Breaking the Silence, criada por ex-soldados israelitas, criticou Smotrich, acusando-o de incentivar a expansão dos colonatos na Cisjordânia enquanto o mundo está concentrado na guerra em Gaza.
“Esta apropriação de terras e expansão de colonatos não só fragmentará ainda mais o território palestiniano, como reforçará o apartheid”, afirmou o grupo.
Nabil Abu Rudeineh, porta-voz do presidente da Autoridade Palestiniana, apelou aos Estados Unidos para pressionarem Israel a parar a construção de colonatos.
O Qatar, que tem mediado entre o Hamas e Israel nas tentativas de garantir um cessar-fogo em Gaza, condenou as ações de Smotrich como uma “violação flagrante do direito internacional”.
O ministro dos Negócios Estrangeiros da Noruega, Espen Barth Eide, disse que a medida mostra que Israel “procura apropriar-se de terras pertencentes a palestinianos para impedir uma solução de dois Estados”.
Construção de casas num ano
O grupo Peace Now, que monitoriza a atividade dos colonatos na Cisjordânia, afirmou que ainda faltam alguns passos antes do início da construção, incluindo a aprovação do Conselho Superior de Planeamento de Israel. Mas, se tudo avançar, as obras de infraestrutura poderão começar dentro de alguns meses, e a construção de casas dentro de cerca de um ano.
“O plano E1 é mortal para o futuro de Israel e para qualquer hipótese de alcançar uma solução pacífica de dois Estados. Estamos à beira de um abismo, e o governo está a conduzir-nos a toda a velocidade”, afirmou o grupo num comunicado.
Os palestinianos já estão desmoralizados pela campanha militar israelita, que matou mais de 61.000 pessoas em Gaza, segundo autoridades de saúde locais, e temem que Israel acabe por os expulsar desse território.
Cerca de 700.000 colonos israelitas vivem entre 2,7 milhões de palestinianos na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental. Israel anexou Jerusalém Oriental — movimento não reconhecido pela maioria dos países — mas não estendeu formalmente a sua soberania à Cisjordânia.
A ONU e a maioria das potências mundiais afirmam que a expansão dos colonatos compromete a viabilidade de uma solução de dois Estados, ao fragmentar o território palestiniano. O plano de dois Estados prevê um Estado palestiniano em Jerusalém Oriental, na Cisjordânia e em Gaza, a existir lado a lado com Israel.
Israel invoca ligações históricas e bíblicas à região, que chama de Judeia e Samaria, e diz que os colonatos oferecem profundidade estratégica e segurança.
A maioria da comunidade internacional considera todos os colonatos ilegais ao abrigo do direito internacional, posição apoiada por várias resoluções do Conselho de Segurança da ONU, incluindo uma que insta Israel a parar toda a atividade de colonatos.
Israel rejeita esta interpretação, dizendo que a Cisjordânia é “território disputado” e não “ocupado”.
Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia impuseram sanções, em junho, a Smotrich e a outro ministro de extrema-direita defensor da expansão dos colonatos, acusando ambos de incitar repetidamente à violência contra palestinianos na Cisjordânia.
A popularidade de Smotrich tem caído nos últimos meses, com sondagens a indicarem que o seu partido não conquistaria qualquer assento caso fossem realizadas eleições legislativas hoje. O seu eleitorado provém, sobretudo, dos colonos.