Anas al-Sharif, o jornalista da Al-Jazeera morto por Israel sob acusações de ser líder de uma célula terrorista do Hamas


Em dezembro de 2023, Anas al-Sharif já tinha visto o seu pai ser morto por um ataque israelita na casa da família no campo de refugiados de Jabalia, em Gaza, recusando-se então a abandonar o território ou a parar a cobertura da guerra. Agora, foi o próprio jornalista da Al-Jazeera ser morto por um ataque de um drone das IDF no fim de semana e que atingiu uma tenda que albergava repórteres junto ao hospital de Al Shifa, em Gaza, provocando oito feridos e sete mortos, dos quais quatro eram jornalistas da estação árabe.
Anas al-Sharif, de 28 anos, era um dos rostos mais mediáticos da Al Jazeera em Gaza e a sua morte não foi um acidente, já que as Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) visaram o jornalista sob a acusação de liderar “uma célula terrorista do Hamas”, além de ser alegadamente “responsável por promover ataques com foguetes contra civis israelitas e forças das IDF”.
Na rede social X, as IDF divulgaram informações e documentos com o intuito de provar a ligação de al-Sharif ao Hamas, considerando que “um cartão de imprensa não é um escudo para o terrorismo”. Israel já tinha lançado anteriormente a acusação de ligações a terroristas sobre o jornalista, mas al-Sharif e a estação Al Jazeera já tinham desmentido a alegação, enquanto defensores dos direitos humanos vincaram que o jornalista foi atacado devido à cobertura jornalística da linha da frente da guerra.
????STRUCK: Hamas terrorist Anas Al-Sharif, who posed as an Al Jazeera journalist
Al-Sharif was the head of a Hamas terrorist cell and advanced rocket attacks on Israeli civilians and IDF troops.
Intelligence and documents from Gaza, including rosters, terrorist training lists and… pic.twitter.com/ypFaEYDHse— Israel Defense Forces (@IDF) August 10, 2025
De igual modo, a relatora especial da ONU para a liberdade de expressão, Irene Khan, criticou então a acusação israelita de ligações ao Hamas, considerando-a uma “alegação infundada” e um “ataque flagrante aos jornalistas”.
Na reação ao ataque — que vitimou ainda o correspondente Mohammed Qreiqeh e os repórteres de imagem Ibrahim Zaher, Mohammed Noufal e Moamen Aliwa —, a estação sediada no Qatar enalteceu al-Sharif como “um dos jornalistas mais corajosos de Gaza” e defendeu que o ataque israelita constituiu “uma tentativa desesperada de silenciar vozes em antecipação à ocupação de Gaza”.
O Comité de Proteção dos Jornalistas manifestou-se “chocado” com a morte dos profissionais neste ataque israelita, algo que al-Sharif assumiu em julho estar à espera de que pudesse acontecer, confessando estar a viver com a “sensação de que poderia ser bombardeado a qualquer momento”.
“O padrão de Israel de rotular jornalistas como militantes sem fornecer provas credíveis levanta sérias questões sobre a sua intenção e respeito pela liberdade de imprensa”, afirmou a diretora regional do CPJ, Sara Qudah, lembrando que os “jornalistas são civis e nunca devem ser alvo de ataques” por parte de Israel.
This is my will and my final message. If these words reach you, know that Israel has succeeded in killing me and silencing my voice. First, peace be upon you and Allah’s mercy and blessings.
Allah knows I gave every effort and all my strength to be a support and a voice for my…
— أنس الشريف Anas Al-Sharif (@AnasAlSharif0) August 10, 2025
Já depois da morte de al-Sharif, foi partilhada na sua conta na rede social X uma mensagem que a Al Jazeera esclareceu ter sido escrita a 6 de abril e na qual o jornalista expressou dor e sofrimento na sua atividade, mas que foi fiel à transmissão da verdade, “sem distorção ou falsificação”.
“Alá pode testemunhar contra aqueles que permaneceram em silêncio, aqueles que aceitaram a nossa morte, aqueles que sufocaram a nossa respiração e cujos corações não se comoveram com os restos mortais espalhados das nossas crianças e mulheres, não fazendo nada para impedir o massacre que o nosso povo enfrenta há mais de um ano e meio”, referiu.
Al-Sharif, que cobriu o conflito em Gaza praticamente desde o ataque do Hamas no dia 7 de outubro de 2023, deixa mulher e dois filhos.