Designer usa motosserra para “dar vida” a árvores
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Aos 70 anos, o designer gaúcho Hugo França, que vive em Trancoso, na Bahia, já faz planos para o lançamento de seu novo livro, Hugo França — Esculturas Mobiliárias, em Portugal. E avisa: “Existe uma chance bastante grande de a gente fazer algum evento em Lisboa, por exemplo. Da minha parte, eu gostaria muito”.
A obra, com 280 páginas e textos do curador Paulo Herkenhoff, será oficialmente lançada nesta quinta-feira (14/08), na FGV Arte, em Botafogo, na Zona Sul do Rio de Janeiro, das 19h às 21h. Será, na verdade um evento duplo, pois o artista também inaugurará, no mesmo espaço, a exposição Natureza, Escultura e Sustentabilidade, a partir das 17h. As entradas são gratuitas.
Desde o fim dos anos de 1980 desenvolvendo “esculturas mobiliárias”, feitas com troncos e raízes de árvores, o designer ressalta que seu trabalho ressignificou a função da motosserra. “Ela é o símbolo do desmatamento, mas eu a uso como uma ferramenta para esculpir as minhas obras”, destaca. “Eu desenho diretamente no resíduo florestal, como tecnicamente se chama a minha matéria-prima, que são de árvores mortas, há pelo menos 50 anos, troncos e raízes”, acrescenta.
Autodidata, o artista explica que faz o resgate e o garimpo do material usado em seu ateliê. E o pequi-vinagreiro abastece 90% da produção. “É uma árvore praticamente extinta. Ela fornecia, na verdade, a madeira para os pataxós fazerem as suas canoas. A minha primeira ação em direção a esse trabalho foi aproveitar as canoas antigas, que os pescadores não utilizavam mais”, afirma.
Divulgação
Ele acrescenta. “Essa árvore não tem características para a construção civil, nem para a marcenaria. Ela se adapta mesmo à confecção de canoas. E tem outras peculiaridades. Por exemplo, é a árvore que tem a maior longevidade em floresta tropical, ela pode viver até 1.200 anos. Ou seja, têm valor arqueológico. Além de ser a única madeira que sobrevive ao fogo”, garante.
“Estupidez de Trump”
Hugo França, que também dá palestras sobre temas como sustentabilidade, enfatiza que tenta alertar as pessoas para a importância das florestas tropicais e para um tratamento mais criterioso do meio ambiente. “Até porque hoje vivemos esse drama, do avanço da extrema-direita no mundo, que parece querer aniquilar a natureza”, afirma
O designer reforça suas preocupações: “Pioramos não só na questão da saturação do planeta, por conta da poluição, mas, ideologicamente, vivemos um péssimo momento. Estamos praticamente, sendo assim um pouco pessimista, a caminho de um suicídio”. E cita o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. “Em relação à estupidez do Trump, creio que ele precisava ser internado.”
Formado em engenharia, Hugo passou um período em São Paulo, até se fixar de vez em Trancoso, onde também tem uma galeria de arte. “Quando eu mudei para a Bahia, construí muitas casas por lá, fiz vários projetos e aprendi muito sobre floresta tropical. Mas, a partir do fim dos anos de 1980, comecei a pensar no aproveitamento da madeira. Assisti a um desmatamento predatório lá, à exploração da floresta pelos madeireiros. Então, pensei em utilizar a madeira de uma outra maneira, e levar isso como uma ferramenta de educação ambiental”, finaliza.
Na exposição, que ficará em cartaz até 13 de outubro, na FGV Arte, o artista apresentará 33 peças de grandes dimensões. Algumas têm funcionalidade e promovem a interação com as pessoas. Mas 70% das “esculturas mobiliárias” da mostra carioca, frisa Hugo França, não são para uso funcional, chegam a ter seis metros de altura e uma tonelada de peso.
“Há esculturas de quatro, cinco toneladas, mas ficaria inviável apresentá-las agora, por conta do espaço. Mesmo assim, o conjunto das obras tem bastante impacto pelo volume, pelas formas orgânicas e pela textura da madeira. Isso cria um efeito especial no olhar das pessoas”, aponta ele, que tem trabalhos expostos em espaços como o Instituto Inhotim, em Minas Gerais.
