A saga da poluição no rio Lis ainda está longe de terminar. Níveis de contaminação continuam elevados

As análises realizadas entre 2022 e 2025 às águas superficiais dos rios Lis e Lena, em Leiria, evidenciam uma melhoria da qualidade, mas os níveis de contaminação de alguns parâmetros ainda são elevados, com focos identificados.
O relatório das análises efectuadas na Bacia Hidrográfica do Lis pelos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento (SMAS) de Leiria, apresentado na reunião de câmara desta sexta-feira, demonstra que o rio Lis na confluência do rio Lena, o seu principal afluente, e a zona de Pinheiros – Porto Moniz, são os pontos de poluição mais elevados de Escherichia coli (E.coli) e de enterecocos.
Segundo os dados divulgados, no primeiro ponto, o parâmetro mais elevado chegou a registar 1.986.000 NMP/100ml de E.coli, quando o valor “razoável” se situa entre os dois mil e os 20 mil. Para a água apresentar uma qualidade “excelente”, os valores não poderiam ultrapassar os 20NMP/100ml. Em Porto Moniz, as análises chegaram a detectar 774.600 NMP/100ml.
Rio Lis, poluição sem fim
O rio Lis, a principal fonte de abastecimento de água a Leiria, lida há décadas com a poluição e já foi descrito como “um ícone da poluição hídrica nacional”. Espuma, mau cheiro, água escura e terrenos enlameados mesmo quando o tempo está quente e seco são frequentemente detectados na ribeira dos Milagres ou na mata desta freguesia de Leiria.
O problema intensificou-se, nos últimos anos, com o crescimento das produções de suínos na região, que reúne mais de 400 suiniculturas intensivas activas.
A contaminação microbiológica na Praia da Vieira, onde desagua o rio Lis, não é incomum durante a época balnear, relata o jornal Região de Leiria. A 17 de Julho, os banhos foram proibidos depois de terem sido detectados “valores elevados de enterococos intestinais e/ou E. coli”, de acordo com a informação divulgada pela Agência Portuguesa do Ambiente, em cujo site também se registavam “valores elevados nas concentrações dos indicadores microbiológicos a 27/6/2024 e 24/7/2024” nas águas da Praia da Vieira.
Águas residuais
O vereador com o pelouro do Ambiente na Câmara de Leiria, Luís Lopes, disse à Lusa que o actual foco de poluição está relacionado com o “saneamento e águas pluviais, estações de tratamento de águas residuais (nomeadamente a ETAR de Olhalvas), ligações indevidas aos cursos de água, descargas indevidas, práticas irregulares industriais e agrícolas, afluentes e colectores de águas pluviais”, entre outras, que derivam para os dois rios.
O autarca sublinhou que se tem verificado um “trabalho constante do Serviço de Vigilância Ambiental, da Brigada de Protecção Ambiental da PSP, do Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, dos SMAS, da Águas do Centro Litoral, Valorlis e de outras entidades” na “monitorização, identificação, fiscalização e correcção de problemas”.
A Câmara de Leiria tem também procurado desenvolver trabalhos de “rectificação e melhoria de algumas infra-estruturas de águas pluviais e saneamento”.
Há vários anos existem apelos para a construção de uma estação de tratamento de efluentes suinícolas (ETES), que chegou a ter um projecto aprovado em 2014 para um investimento estimado em mais de 21 milhões de euros, mas que perdeu financiamento em 2019.
Fosfatos, amónia e nitratos
Os fosfatos são o parâmetro com piores resultados das águas dos rios Lis e Lena, com valores a triplicarem os níveis mínimos aceitáveis em diferentes pontos de recolha. “Os fosfatos terão causa, neste caso, em fontes antropogénicas que incluem o uso de fertilizantes na agricultura, descargas de esgotos e o uso de detergentes”, explicou o vereador Luís Lopes.
O vereador do Ambiente defende, por isso, a necessidade de “actuar em todas estas origens, usos e locais de forma a diminuir gradualmente a presença de fosfatos nas massas de água”.
Os níveis de amónia no rio Lis foram mais elevados nos pontos de recolha do rio Lena, em Porto Moniz e Ponte das Mestras. Nas três hortas municipais, os valores deste parâmetro também estão altos.
Relativamente aos nitratos, os dados evidenciam valores praticamente baixos em quase todos os pontos de recolha de amostras. O ph da água encontra-se em níveis de “excelente”.
Recuperar massas de água
O SMAS fez uma monitorização entre 2022 e 2025 em 15 pontos de colheita ao longo de cerca de sete quilómetros (km) do rio Lis e de 1,5 km do rio Lena e em três hortas municipais.
“Verificamos uma tendência de melhoria da qualidade de águas superficiais dos cursos de água analisados, o Lis e o Lena, ainda que com tendências mais favoráveis para alguns dos parâmetros avaliados”, constata o autarca.
O vereador Luís Lopes considera que “estes dados devem ser interpretados com muita responsabilidade e compromisso”, assegurando a “monitorização e acções que permitam consolidar e manter a qualidade de água destas massas”.
Para o autarca, “durante décadas os rios foram na prática canais de esgotos domésticos e industriais a céu aberto, sem controlo ou fiscalização”. O objectivo agora é a “inversão e recuperação destas massas de água”, de modo que as acções sejam consequentes.
“Identificação das fontes de poluição difusas, operação das infra-estruturas de tratamento de águas residuais, infra-estruturas de saneamento básico, episódios eventuais de descargas em massa de água, reforço de monitorização e fiscalização, capacitação, sensibilização e educação da comunidade” são medidas preconizadas pelo vereador. com Lusa
