PRR 2021-2026: uma oportunidade perdida na saúde?

Quatro anos após o arranque da famosa bazuca, Portugal arrisca-se a perder uma oportunidade única de tratar alguns dos males do Serviço Nacional de Saúde (SNS). A promessa era clara: usar 2,1 mil milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para reforçar os cuidados de saúde primários e hospitalares, os cuidados continuados e paliativos e a saúde mental, modernizar infraestruturas e equipamentos e investir decisivamente na digitalização do setor. A realidade é outra – a execução dos fundos da saúde é lenta, fragmentada e insuficiente para alcançar resultados expressivos até meados de 2026.

A saúde é dos setores com pior desempenho no PRR. Se Portugal já gastou cerca de 39% dos 22,2 mil milhões de euros disponíveis no PRR, a saúde não vai além dos 23%. As notícias sobre a execução na saúde vão sendo publicadas a conta-gotas, mas apenas 379 milhões de euros chegaram, efetivamente, às entidades executoras.

O PRR é uma gota no oceano do gasto público em saúde, mas essencial para atacar alguns dos problemas crónicos do SNS. Este financiamento destina-se a investimentos adiados por falta de verba. Temos centros de saúde degradados, hospitais envelhecidos, equipamentos obsoletos e uma digitalização incipiente.

A Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR considera que a situação da execução na saúde é crítica, especialmente no que respeita a investimentos nos cuidados de saúde primários, continuados e paliativos. Os programas de modernização tecnológica do SNS e o Sistema Universal de Apoio à Vida Ativa também precisam de maior acompanhamento para garantir a concretização. A única ação considerada alinhada com o planeamento é a dos hospitais na região de Lisboa, graças à aquisição de equipamento para o Hospital de Sintra e à reprogramação dos outros investimentos hospitalares para junho de 2026.

Falta executar a maioria das empreitadas nos centros de saúde, hospitais e nas redes nacionais de cuidados continuados e paliativos. Das 557 obras previstas em centros de saúde, hospitais e unidades de cuidados continuados, apenas 67 estão concluídas e 47 em curso. Dos 676 milhões para os cuidados de saúde primários (expansão de unidades móveis e centros de saúde, modernização operacional e reforço da capacidade local), 321 milhões para reforçar equipamentos e infraestruturas hospitalares e 235 milhões para as redes de cuidados continuados e paliativos, apenas uma pequena parte foi paga. Foram adquiridos 772 veículos elétricos, mas, por exemplo, a maioria das 81 viaturas entregues à região do Algarve continuam paradas por falta de postos de carregamento, também financiados pelo PRR.

A situação na área da saúde mental, uma prioridade no pós-pandemia, também é considerada preocupante. Apenas foi utilizada uma fração dos 88 milhões para a reforma da saúde mental. Encontram-se por criar 500 lugares em estruturas residenciais para a desinstitucionalização. Falta iniciar uma de quatro novas unidades de internamento em hospitais gerais. Das três unidades de internamento forense planeadas, cada uma com o valor de 5,7 milhões de euros, encontra-se atrasada a requalificação de duas. Apenas uma de três unidades residenciais forenses de transição para a comunidade está concluída.

A digitalização na saúde avança a passo de caracol na prometida interoperabilidade de sistemas, RSE (Registo de Saúde Eletrónico) acessível, e-prescrição mais ágil, telemedicina funcional e plataformas mais amigáveis para utentes e profissionais. A conclusão das atividades está três anos atrasada, só tendo sido pago cerca de um terço dos 300 milhões de euros disponíveis nesta área. Por exemplo, a operacionalização do RSE aguarda a publicação de normas europeias sobre diagnósticos comuns e cifrados. Entretanto, persistem sistemas incompatíveis, falhas de comunicação entre unidades e processos administrativos arcaicos que dificultam a vida a utentes e profissionais.

A ladainha dos motivos da fraca execução no setor da saúde é a mesma de sempre: falta de visão de longo prazo; burocracia excessiva, com processos de contratação pública lentos e pouco adaptados a projetos urgentes; concursos desertos porque os preços de referência estão desajustados face ao mercado; e, entre outras razões, capacidade técnica limitada. Tudo isto num contexto de instabilidade institucional – incluindo a criação da Direção Executiva do SNS e das Unidades Locais de Saúde e a extinção das Administrações Regionais de Saúde – em que se espera que múltiplas entidades centrais e locais concretizem investimentos muito diversos.

Que remédios podem ainda assegurar bons resultados, em tempo útil? Eis algumas medidas urgentes: priorizar os cuidados primários, continuados e paliativos e a saúde mental, onde a carência é mais visível e o retorno social dos investimentos é maior; reforçar as equipas técnicas da CNA, Ministério da Saúde e instituições responsáveis pela execução do PRR, dando-lhes capacidade para planear, aprovar, executar e acompanhar múltiplos projetos complexos; descentralizar decisões e dar autonomia a quem está no terreno, evitando entraves administrativos; e rever os processos de contratação pública para adequar preços e acelerar concursos.

Os investimentos do PRR em infraestruturas e equipamentos do SNS são indispensáveis, mas não são suficientes. A Comissão Europeia recomendou ao Governo que acelere a execução do PRR na área da saúde, mas nota que o SNS continua a enfrentar escassez significativa de profissionais de saúde; e que, entre 2020 e 2024, apenas cerca de metade das vagas para médicos foram preenchidas, enquanto a emigração de enfermeiros é significativa. A falta de profissionais em especialidades tão críticas como a saúde familiar, pediatria, obstetrícia, cirurgia e anestesiologia é o principal problema do SNS, impondo-se ser resolvido simultaneamente com a execução do PRR.

O Estado também deve assegurar que o investimento europeu no SNS não se destina a ser entregue ao setor privado, com a desculpa de que é onde se encontram os profissionais de saúde necessários ao serviço público. Para atrair profissionais de saúde para o SNS, a Comissão Europeia recomenda simplificar e acelerar processos de recrutamento. Para os reter, o SNS precisa de lhes oferecer carreiras estabelecidas e seguras.

Poucos cidadãos sabem onde estão a ser aplicados os milhões do PRR na saúde, quais os critérios de seleção dos projetos ou qual o seu impacto real. A opacidade mina a confiança dos profissionais e da população, que continuam a enfrentar tempos de espera excessivos, falhas de resposta nos cuidados primários e falta de alternativas em saúde mental e cuidados continuados e paliativos. Garantir a transparência nos fundos do PRR passa por publicar dados claros e detalhados sobre o progresso na execução de todas as atividades, incluindo montantes atribuídos e pagos.

O tempo das promessas já passou, esperam-se agora resultados mais visíveis no terreno. Portugal tem até agosto de 2026 para executar a totalidade dos fundos do PRR. Ao ritmo atual é pouco credível que o objetivo seja atingido sem mais reprogramações ou pedido de prolongamento do prazo. Se nada mudar, o que seria uma oportunidade única ficará na história da saúde em Portugal como mais uma promessa perdida.

António Faria Vaz, Francisco Ramos, Guadalupe Simões, Isabel do Carmo, Isabel Prado e Castro, Jennifer Santos, Joana Mira Godinho, João Durão Carvalho, João Oliveira, Manuela Silva, Mário André Macedo, Paulo Salgado Membros do Grupo de Saúde da Associação Causa Pública

Os autores escrevem segundo o acordo ortográfico de 1990

Água de cometa tem pistas sobre a vida na Terra

Os cometas podem ter desempenhado um papel crucial no fornecimento de água – e possivelmente alguns dos ingredientes moleculares para a vida – ao nosso planeta. Uma nova investigação revelou evidências convincentes de que a água de um cometa é muito semelhante à encontrada nos oceanos da Terra, oferecendo um novo apoio à ideia de que os cometas podem ter desempenhado um papel crucial no fornecimento de água – e possivelmente alguns dos ingredientes moleculares para a vida – ao nosso planeta. Usando o poderoso ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), uma equipa internacional de cientistas liderada por Martin Cordiner, do

Portugal supera Islândia em novo teste rumo ao Eurobasket

Terminou com uma vitória o quarto encontro de preparação da selecção portuguesa com vista à participação no Eurobasket 2025, que arranca no final do mês, na Letónia. Em Braga, Portugal bateu nesta sexta-feira a Islândia (83-79), adversário que também estará no Campeonato da Europa, com uma exibição feita em crescendo.

Foi um jogo equilibrado, com o primeiro e o segundo quartos a caírem tangencialmente para o lado dos islandeses (20-22 e 22-23), essencialmente por força de um maior acerto nos lançamentos longos.

Portugal, que teve Neemias Queta em dúvida, por lesão, utilizou o poste dos Boston Celtics com pinças (ficou fora do cinco inicial e somou um total de 14 minutos), mas conseguiu superiorizar-se ao adversário no segundo tempo, com uma entrada em campo após o intervalo que prometia mudar o rumo da partida.

No início do último período, a selecção orientada por Mário Gomes já ganhava por 66-61 e os sinais eram positivos, mas a Islândia reagiu e deu a volta (70-72), novamente à custa da eficácia no tiro exterior.

Já com Neemias de volta ao campo, Portugal — que teve em Travante Williams o melhor marcador (21 pontos) — voltou a estabilizar o jogo, ganhou outro tipo de capacidade na luta das tabelas e acabou por levar a melhor, por quatro pontos.

“Tivemos dificuldades no início do jogo na defesa. É uma equipa na qual temos dificuldades em encaixar, porque tem uma quantidade grande de lançadores. Conseguimos melhorar defensivamente e melhorámos bastante no ataque. Estou muito satisfeito com a participação da equipa”, resumiu Mário Gomes.

No sábado, novamente em Braga, a selecção volta a entrar em acção para medir forças com a Suécia (18h), que também competirá no Europeu, fechando o ciclo de preparação diante do Sporting, no dia 21, antes da partida para Riga.

Incêndios. Mais de 3.550 operacionais combatem principais fogos à meia-noite

Mais de 3.550 operacionais combatiam pelas 00h15 os oito principais incêndios em curso no continente, com os sinistros de Sátão (distrito de Viseu), Arganil (Coimbra) e Trancoso (Guarda) a concentrarem o maior número de meios, segundo a Proteção Civil.

De acordo com a página na Internet da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), estavam no terreno 3.556 operacionais e 1.168 meios terrestres nos oito incêndios significativos em curso.

O incêndio em mato em Vila Boa, Sátão, na região de Viseu, Dão e Lafões, que teve início na quarta-feira, às 00h03, mobilizava 1.028 operacionais e 334 meios terrestres, seguido da ocorrência do Piódão, em Arganil, no distrito de Coimbra, que deflagrou também na quarta-feira, às 05h08, em consequência de uma descarga elétrica de uma trovoada seca, que empenhava 1.012 operacionais e 342 veículos.

As chamas em Frexes, Trancoso, na região das Beiras e Serra da Estrela, que eclodiram em 09 de agosto, às 16h21, eram combatidas por 445 operacionais e 149 meios terrestres, enquanto o incêndio que lavrava em povoamento florestal em Candal, na Lousã, no distrito de Coimbra, desde quinta-feira, às 13h46, mobilizava 332 operacionais e 104 meios terrestres.

O incêndio agrícola em Poiares, Freixo de Espada à Cinta, na região do Douro, com início às 13h17 de sexta-feira, empenhava 287 operacionais e 93 meios terrestres, ao passo que o sinistro em Pêra do Moço, na Guarda, iniciado na sexta-feira, às 10h44, envolvia 238 operacionais e 86 veículos.

Já no Alto Alentejo, em São Gens, Nisa, no distrito de Portalegre, um incêndio em povoamento florestal, que eclodiu às 18h13 de sexta-feira era combatido por 138 operacionais e 39 meios, enquanto as chamas que consumiam mato em Aldeia de Sabugal, no Sabugal, distrito da Guarda, iniciadas às 14h41 de sexta-feira eram combatidas por 76 operacionais e 21 meios terrestres.

Em resolução, estavam três incêndios, em Sirarelhos, Vila Real, que teve início em 3 de agosto, que ainda mobilizava 151 operacionais e 47 meios terrestres, em Tábua e Pereiro, Tabuaço, no distrito de Viseu, que deflagrou no dia 11, com 89 operacionais e 29 meios, e ainda em povoamento florestal na Tapada do Loureiro, Portalegre, com início na quinta-feira, com 157 operacionais e 52 meios.

A ANEPC contabilizava, pelas 00h50, no combate a incêndios florestais, em mato e agrícolas, em curso e em resolução, 47 ocorrências que empenhavam 4.615 operacionais e 1.500 meios terrestres.

De acordo com Mário Silvestre, comandante nacional de Emergência e Proteção Civil, entre as 00h00 e as 17h00 de sexta-feira, registaram-se “65 ocorrências, 16 das quais em período noturno”, ou seja até às 08h00, que empenharam 2.080 operacionais, com 556 meios terrestres e 170 missões com os meios aéreos.

No ponto de situação na sede da ANEPC, em Carnaxide (Oeiras), pelas 19h00, o responsável operacional referiu que de 14 ocorrências em curso 10 eram as que mais preocupavam, mobilizando então 3.023 operacionais, 1.000 veículos e 26 meios aéreos.

O estado de prontidão especial do Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais (DECIR) mantém-se desde 11 de agosto no nível máximo de quatro, e encontram-se ativados os planos distritais de Emergência e Proteção Civil de Viseu e Coimbra, e os planos municipais de Trancoso, Oliveira do Hospital, Arganil, Aguiar da Beira, Sátão, Sernancelhe, Seia, Pampilhosa da Serra, Tábua e Góis.

A ANEPC, perante a declaração de situação de alerta em vigor, salientou para a proibição do acesso e circulação nos espaços florestais, de realização de queimadas e queimas e a suspensão das autorizações que tenham sido emitidas, de trabalhos nos espaços florestais com recurso a qualquer tipo de maquinaria, e de trabalhos nos demais espaços rurais, bem como da utilização de fogo de artifício ou outros artefactos pirotécnicos.

Freixo de Espada à Cinta. “Dizem que estão 300 operacionais. É mentira”, diz autarca

Não há mãos a medir em Freixo de Espada à Cinta. As fortes chamas estão a deixar a população de várias freguesias em alerta, isto depois de também já haver registo de casas destruídas.

Ouvido pela Renascença, o presidente da Câmara, Nuno Ferreira, diz que os meios são poucos e critica a falta de resposta do Governo.

“Eu desde as duas da tarde estou a pedir meios aéreos para evitar aquilo que foi uma calamidade e que destruiu a nossa floresta toda. Veio apenas um helicóptero. Um helicóptero apenas”, começa por desabafar o autarca, que vai mais longe: “Dizem que estão 300 operacionais. É mentira. Estão apenas 190 operacionais aqui no terreno e os homens estão exaustos. Já não conseguem fazer mais, estão a dar tudo por tudo”, lamenta, garantindo que o que se está a passar no concelho é “bastante caótico”.

“Aquilo que apelamos é que, de uma vez por todas, nos mandem meios para podermos combater este incêndio, que se está a transformar numa calamidade e que já destruiu a floresta praticamente toda do concelho”, pede o autarca, que confirma que em diversos locais já arderam “pelo menos duas ou três casas”. “Durante o dia é que poderemos fazer a avaliação dos danos causados, porque são imensos e tremendos, daquilo que ardeu e ainda continua a arder”, assegura.

“Ou mandam de uma vez por todas meios para o nosso terreno para nos ajudar a combater o incêndio ou isto vai tomar proporções mais gigantescas”, vaticina o autarca, que adivinha uma noite muito complicada no seu concelho. “Os meios são insuficientes. Estou a falar desde as duas da tarde com o secretário de Estado e só obtive resposta às sete e meia da tarde e, até agora, o que temos visto é praticamente zero. Não estão os meios no terreno e não está a ser ajuda suficiente para levar isto a bom porto. São os mesmos homens que estão aqui a combater, exaustos, há horas e horas seguidas”, lamenta.

Apesar de tudo, o autarca congratula-se com a ausência de feridos, até ao momento. “A principal preocupação tem sido salvaguardar as populações. Já retiramos pessoas para a unidade de cuidados continuados, para salvaguardar e para dar assistência às pessoas que se sentiram mal aqui”, adianta.

Chamas de Sátão e Trancoso chegam a Foz Coa e mantém três frentes

Os incêndios que deflagraram em Sátão e Trancoso, e se uniram num único fogo, atingiram esta sexta-feira um décimo primeiro município, Vila Nova de Foz Coa, mantendo três frentes ativas, e já arderam habitações em Aguiar da Beira.

“Com a entrada da noite houve alguma acalmia, daquilo que tem sido a intensidade que o incêndio tem gerado durante todo o dia. Mantêm-se três frentes ativas e, algumas zonas dessas frentes, mantêm intensidade e dificuldade em termos de combate”, admitiu à agência Lusa pelas 22h15 o segundo comandante regional do Centro, Jody Rato.

Jody Rato especificou que essas dificuldades têm a ver com “os acessos ou mesmo a extensão das frentes”, sendo que a estratégia do combate “tem sido privilegiar a proteção das pessoas e bens, como edificado”.

“Sempre que possível, e de acordo com a estratégia definida, vamos continuando a combater o incêndio, tentando ao máximo reduzir as zonas ativas para, gradualmente, conseguir dominar o incêndio”, acrescentou.

O comandante adiantou ainda que este incêndio, que se juntou nas últimas 24 horas aos fogos vindos de Sátão (distrito de Viseu) e Trancoso (distrito da Guarda), e que se alastrou a outros oito municípios, chegou hoje a um décimo primeiro, a Vila Nova de Foz Coa (Guarda).

“A frente rodou, literalmente, e entrou em Vila Nova de Foz Coa e é nessa zona que o incêndio está mais ativo e é onde vamos privilegiar em termos de combate”, reconheceu o comandante.

Ainda assim, “há outras zonas que se mantêm ativas e que também estão a ser combatidas, até pela extensão que este incêndio alcançou”.

Jody Rato disse ainda à agência Lusa que “há uma vítima mortal, mas não tem nada a ver com este incêndio, ou seja, não morreu por esse motivo, era um senhor com cerca de 70 anos, que sofria de patologia cardíaca, inclusive já tinha sido operado”.

“O senhor foi socorrido pela viatura médica que está ao nosso dispositivo, mas a razão da morte nada teve a ver com o incêndio, foi sim, socorrido pelos meios que estão no teatro de operações. Morreu hoje como podia ter morrido noutro dia”, esclareceu Jody Rato.

Relativamente às consequências do incêndio, Jody Rato acrescentou que “há já a confirmação de algumas residências de primeira habitação a lamentar”, apesar de reconhecer que “ainda não há uma visão geral” dos prejuízos.

As residências arderam em Aguiar da Beira, distrito da Guarda.

Este incêndio afeta os municípios de Sátão, Sernancelhe, Moimenta da Beira, Penedono e São João da Pesqueira (distrito de Viseu); Aguiar da Beira, Trancoso, Fornos de Algodres, Meda, Celorico da Beira e Vila Nova de Foz Coa (distrito da Guarda).

O incêndio de Vila Boa, freguesia de Ferreira de Aves, em Sátão, distrito de Viseu, teve alerta às 01h03 de quarta-feira e no mesmo dia chegou aos municípios de Sernancelhe, também no distrito de Viseu, e ao de Aguiar da Beira, distrito da Guarda.

Pelas, 23h30, combatiam este incêndio 1.026 operacionais, apoiados por 333 veículos, segundo a página oficial da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC).

O alerta para o incêndio de Freches, no Município de Trancoso, distrito da Guarda, aconteceu no sábado, dia 09, às 17h21.

Pelas, 23h30, combatiam este incêndio 445 operacionais, apoiados por 149 veículos, segundo a página oficial da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC).

Para já, deixem a Bastilha em paz

Um homem já não pode ir de férias descansado sem que alguma direita portuguesa seja acometida de uma súbita e incontrolável vontade de levar a cabo a tomada da Bastilha. Depois da decisão do Tribunal Constitucional de chumbar uns quantos artigos da lei dos estrangeiros, dois grupos saíram às ruas com a firme determinação de erguer uma guilhotina política na Rua da Academia das Ciências: uns, gritam que é indispensável expurgar finalmente a Constituição dos alçapões que lá foram colocados durante o processo revolucionário; outros, berram que é urgente mudar de alto a baixo as togas que se sentam no Palácio Ratton.

Os militantes do primeiro grupo estão a ser vítimas da precipitação. Se parassem para pensar (o que é sempre recomendável), perceberiam que um dos principais argumentos usados pela “maioria de chumbo” no tribunal para abater a lei dos estrangeiros foi o artigo 68 da Constituição, que diz respeito, imagine-se, à “paternidade e maternidade”. Para defenderem maiores facilidades no “reagrupamento familiar”, aqueles juízes argumentaram que “a ‘insubstituível ação [dos pais e das mães] em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação’, deve ser valorizada e protegida”. Deus nos fulmine a todos com um raio se houver alguma alma que se diga de direita e que pretenda redigir uma nova Constituição que não “valorize” e “proteja” o papel “insubstituível” da família em tudo o que diz respeito à “educação” dos filhos. Claramente, a parede contra a qual a lei dos estrangeiros embateu com estrondo não foi a do “caminho para uma sociedade socialista” proclamado no preâmbulo da Constituição — foi a da “família”, a da “proporcionalidade”, a da “igualdade” e a do respeito pelas áreas de atuação exclusivas do Parlamento, princípios que terão sempre de fazer parte de qualquer texto constitucional, seja ele escrito por Vasco Lourenço ou por Genghis Khan.

Os militantes do segundo grupo, que pretendem encher preventivamente o Tribunal Constitucional de juízes amigos, estão a mostrar falta de argúcia política. Claro: em todas as democracias, as diferentes maiorias eleitorais tentam nomear para os tribunais constitucionais juízes que partilhem os seus pontos de vista sobre a sociedade, sobre a vida e sobre a política. É naturalíssimo. Se em Portugal a esquerda sempre fez isso, chegando o PS a nomear juízes desastrosos indicados pelo PCP e juízes desastrados indicados pelo Bloco de Esquerda, evidentemente que agora será a vez da direita fazer as suas legítimas escolhas. Aliás, terá uma enorme amplitude nessa atividade benemérita, tendo em conta que, há não muito tempo, os socialistas chegaram a depositar no Palácio Ratton um antigo membro dos seus governos, numa demonstração de omnipotência, de descaramento e de desprezo pela separação de poderes. Obviamente, a direita deverá dedicar tempo e competência a esse exercício de escolha dos novos juízes do Tribunal Constitucional porque, como mais uma vez ficou provado no acórdão sobre a lei dos estrangeiros, e ao contrário do que alguns ingénuos pensam, o mais importante não é determinar quem escreve a Constituição — é determinar quem a lê. No limite, qualquer texto constitucional pode ser incrível ou imprestável consoante a forma como é interpretado em cada acórdão concreto. Apesar disso, que é verdadeiro e importante, neste especial caso da lei dos estrangeiros é do máximo interesse do governo resolver o assunto antes da entrada de novos juízes. Se uma segunda redação da lei receber a bênção dos atuais membros do Tribunal Constitucional, a maioria parlamentar evitará a aparência de um golpe político e terá uma vitória que será impossível de contestar pela esquerda.

Ainda por cima, deverá ser relativamente fácil ultrapassar muitas das atuais dificuldades. Ao contrário do que pareceu nas primeiras horas de desorientação e indignação, há vários pontos em que a decisão do Tribunal Constitucional está longe de ser catastrófica para a maioria parlamentar — vistas bem as coisas, em muitos deles até lhe é favorável.

Uma das mudanças na lei dos estrangeiros que foi travada é a da exigência de permanência em Portugal durante pelo menos dois anos para que um imigrante possa reclamar o direito ao chamado “reagrupamento” com qualquer familiar que não seja um filho menor. Mas, mesmo assim, a “maioria de chumbo” no Constitucional até reconheceu que “não se pode afirmar” que a definição daquele prazo “seja inadequada à prossecução das finalidades tidas em vista pelo legislador”. Mais: admitiu, na sua linguagem tortuosa, que “não se pode concluir que a medida seja inidónea” e que, portanto, sim, pode ser estabelecido um “prazo-regra” para o exercício do “reagrupamento familiar”. Aquilo que estes juízes censuraram foi apenas o facto de esse prazo de dois anos ser, supostamente, “automático, absoluto e inalterável”. Ou seja: chumbaram aquilo que entendem ser “a exclusão da possibilidade de se demonstrar que, apesar de não ter decorrido o prazo legal previsto, a entrada em Portugal dos concretos familiares a reagrupar se justifica, no caso concreto e à luz de uma avaliação ponderada de todos os elementos relevantes, como forma de assegurar de modo efetivo o direito à vida familiar”. Parece que há aqui uma divergência entre a “maioria de chumbo” e a maioria parlamentar, mas, na realidade, não há divergência nenhuma: pelos vistos, a direita concorda com esta preocupação dos juízes. Como o próprio acórdão refere, o gabinete do primeiro-ministro entregou ao tribunal um parecer do Centro Jurídico do Estado onde se argumenta que já existe “uma espécie de cláusula de salvaguarda”, num outro artigo da lei, que “permite, em determinadas circunstâncias, a dispensa do decurso do prazo de dois anos”. Os juízes entenderam que aquele artigo não diz o que Luís Montenegro afirma que ele diz, mas a solução para este conflito de interpretações é simples: se tanto a “maioria de chumbo” como a maioria parlamentar concordam que o prazo de dois anos deve ter uma válvula de escape para alguns casos concretos, então basta tornar isso explícito na nova versão da lei dos estrangeiros e assim não haverá motivo para uma segunda declaração de inconstitucionalidade.

Há outra objeção da “maioria de chumbo” que é mais fácil de resolver. A lei dos estrangeiros determina que “o requerente e os respetivos familiares devem cumprir medidas de integração”, entre elas a “aprendizagem da língua portuguesa e dos princípios e valores constitucionais portugueses” e isso foi chumbado. Mas os juízes não colocam em causa que essas exigências existam, a única objeção tem a ver com uma indefinição do calendário. Segundo eles, a formulação escolhida pela maioria parlamentar “não esclarece” se aquelas aprendizagens “devem ser cumpridas antes ou depois da apresentação do pedido de reagrupamento familiar”. De acordo com os juízes, ao não ter “a necessária precisão e o indispensável rigor”, a proposta legislativa que lhes foi entregue cria uma situação equívoca e remete a clarificação para uma posterior portaria do governo. Problema: como a Constituição estabelece que esta matéria só pode ser definida pelo Parlamento, uma intervenção do governo violaria uma área que é da reserva exclusiva da Assembleia da República. Mais uma vez: parece que há aqui uma divergência, mas, na realidade, não há divergência nenhuma porque a maioria parlamentar entendia ser evidente pela forma como a lei estava escrita que as “medidas de integração” só deveriam ser cumpridas depois do “reagrupamento familiar”, até porque é isso que acontece na esmagadora maioria dos países da União Europeia, com a notória exceção da França. Sendo assim, bastará que, recorrendo a três ou quatro novas palavras, uma segunda versão da legislação torne isso claro.

Há uma terceira objeção da “maioria de chumbo” do Tribunal Constitucional que é ainda menos problemática. Tem a ver com o uso e significado da palavra “designadamente”. O artigo da lei que deixou os juízes confusos afirma o seguinte: “O requerente e os respetivos familiares devem cumprir medidas de integração, designadamente relativas à aprendizagem da língua portuguesa e dos princípios e valores constitucionais portugueses, bem como da frequência do ensino obrigatório no caso de menores, conforme regulado em portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das migrações, da educação e do trabalho”. Para a maioria parlamentar, a palavra “designadamente” tem um significado taxativo: as “medidas de integração” são aquelas que estão enunciadas no artigo da lei e mais nenhuma. Ou seja: a aprendizagem do português, a aprendizagem dos princípios e valores constitucionais, e, no caso de menores, a frequência do ensino obrigatório. Mas, para a “maioria de chumbo”, a palavra “designadamente” tem um significado “meramente exemplificativo”, podendo a subsequente portaria acrescentar outras exigências àquelas que estão listadas na lei. Se fosse assim, teríamos de novo o governo a interferir em matéria exclusiva da Assembleia da República, o que seria inconstitucional. Pela terceira vez: parece que há aqui uma divergência, mas, na realidade, não há divergência nenhuma porque os juízes não põem em causa a existência daquelas exigências para o “reagrupamento familiar” que constam da lei — querem é prevenir que posteriormente surjam outras. Uma nova versão da lei dos estrangeiros terá apenas de evitar palavras ambíguas, como este “designadamente”, e tornar claro que as “medidas de integração” a cumprir pelos familiares que pretendem o reagrupamento são apenas e só as que estão enunciados no artigo.

Olhando para estes três exemplos, percebe-se que uma parte substancial dos problemas criados à maioria parlamentar por este acórdão não são políticos — são, digamos, gramaticais. Por isso, para já, não é preciso sacar da bazuca para matar uma formiga. A direita deve, simplesmente, reformular a lei e evitar dúvidas espúrias de interpretação.

Mas, ao mesmo tempo, convém que a maioria parlamentar não seja ingénua. A segunda versão da lei dos estrangeiros deve ser apresentada ao Presidente da República e ao Tribunal Constitucional o mais rapidamente possível para evitar a armadilha que há não muito tempo fez sucumbir a lei da eutanásia pretendida pela esquerda. Durante meses e meses, o texto do Parlamento foi reformulado e chumbado uma e outra vez até que, a dada altura, a antiga maioria parlamentar se esfumou e, com ela, a lei. Esse processo deve, naturalmente, ser uma lição. Se, a dada altura, se perceber que a “maioria de chumbo” do Constitucional está a inventar motivos para acumular vetos às diferentes propostas de lei dos estrangeiros com objetivos meramente políticos, aí as coisas poderão mudar. Em 1980, na pré-história do Tribunal Constitucional, o então primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro teve de suportar sucessivos chumbos da lei que pretendia iniciar um modesto processo de privatização de uma economia inteiramente abocanhada por um Estado que aspirava ao socialismo e ao terceiro-mundismo. Na época, o líder da direita suportou inúmeras humilhações até o país perceber que o que estava em causa não era a Constituição, mas uma alergia ao resultado eleitoral que tinha dado a primeira maioria absoluta à AD. A não ser que esse episódio se repita, a direita deve deixar a Bastilha em paz.

O celibato na Igreja Católica Oriental e Ocidental

Nem sempre foi obrigatório o celibato dos presbíteros católicos pois, nos primeiros tempos da história da Igreja, também os homens casados eram admitidos ao sacerdócio. Este costume manteve-se na Igreja católica oriental, mas não na Igreja católica latina, na qual o celibato é condição sine qua non para a ordenação sacerdotal.

O precedente da Igreja primitiva, o exemplo da Igreja católica oriental, o recente escândalo dos abusos de menores por sacerdotes, bem como a escassez de clero celibatário relançaram a questão da obrigatoriedade do celibato na Igreja católica latina.

Para este efeito, pareceu oportuno entrevistar o Papa São Paulo VI (*), que dedicou ao celibato sacerdotal uma das suas mais importantes encíclicas.

– Ao princípio, a Igreja católica não exigia o celibato aos candidatos ao presbiterado. Alguns Padres da Igreja, os primitivos escritores eclesiásticos, parecem até mais inclinados à ordenação de homens casados do que de homens solteiros …

“A estreita ligação – dizem alguns – que os Padres da Igreja e os escritores dos tempos passados estabelecem entre a vocação para o sacerdócio ministerial e a sagrada virgindade tem a sua origem em mentalidades e situações históricas muito diferentes das do nosso tempo. Lemos, na verdade, muitas vezes, nas obras dos Padres [da Igreja], que eles aconselham os sacerdotes mais a moderar o uso do matrimónio do que a guardar o celibato” (nº 6).

– Pode-se então dizer que a tradição do celibato eclesiástico não é apostólica, nem tem as suas raízes na primitiva Igreja?

“Na antiguidade cristã os Padres da Igreja e os escritores eclesiásticos dão testemunho da difusão, tanto no Oriente como no Ocidente, da prática livre do celibato entre os ministros sagrados, pela sua grande conveniência com a dedicação total deles próprios ao serviço de Cristo e da sua Igreja” (nº 35).

– Mas a obrigação do celibato na Igreja latina é relativamente tardia, não é?

“A partir dos fins do século IV, a Igreja do Ocidente, pela intervenção de vários Concílios provinciais e dos Sumos Pontífices, corroborou, desenvolveu e sancionou esta prática” (nº 36).

– A quem coube a iniciativa de propor o celibato na Igreja católica latina?

“Foram sobretudo os supremos Pastores e Mestres da Igreja de Deus, guardas e intérpretes do património da fé e da santidade dos costumes cristãos, que promoveram, defenderam e restauraram o celibato eclesiástico nas sucessivas épocas da história, mesmo quando se manifestavam oposições no próprio clero, e os costumes de uma sociedade decadente não eram favoráveis ao heroísmo da virtude.” (nº 36).

– No Oriente, pelo contrário, sempre se manteve e mantém, tanto na Igreja católica oriental como na Igreja ortodoxa, a disciplina do celibato opcional e, por isso, para além dos padres celibatários, também há padres casados. Não seria mais saudável que na Igreja católica latina igualmente ambos pudessem coexistir?

“Não será inútil ainda observar que, mesmo no Oriente, só os sacerdotes celibatários são ordenados Bispos, e os próprios sacerdotes não podem contrair matrimónio depois da ordenação sacerdotal; o que dá a entender como mesmo aquela veneranda Igreja possui em certa medida o princípio do sacerdócio celibatário e o de uma certa conveniência do celibato para o sacerdócio cristão, de que os Bispos possuem o cume e a plenitude.” (nº40).

– Não obstante esse apreço, também na Igreja católica oriental, pelo celibato sacerdotal, não se pode negar que, na Igreja católica ocidental, há um crescente interesse pela revisão do estatuto do clero secular, nomeadamente no que respeita à obrigatoriedade do celibato…

“Os Sumos Pontífices dos últimos tempos desenvolveram o seu mais ardente zelo e esforço doutrinal para esclarecer e estimular o clero na prática desta observância.” (nº 37).

– Mas o Papa São João XXIII, ao convocar o Concílio Vaticano II, não pretendeu modernizar a Igreja, nomeadamente no que respeita ao celibato sacerdotal?

“Não queremos deixar de render particular homenagem à piedosa memória do nosso imediato Predecessor [o Papa João XXIII], ainda vivo no coração dos homens, que pronunciou, no Sínodo Romano, com a aprovação sincera do nosso clero de Roma, estas palavras: ‘Aflige-nos que alguns possam imaginar que a Igreja Católica deliberadamente, ou por conveniência, virá a renunciar aquilo que, ao longo dos tempos, foi e continua a ser uma das glórias mais nobres e mais puras do seu sacerdócio. A lei do celibato eclesiástico e o cuidado de a fazer prevalecer evoca sempre os combates dos tempos heróicos, quando a Igreja de Cristo teve de lutar e conseguiu fazer triunfar a sua gloriosa trilogia, emblema constante de vitória: Igreja de Cristo livre, casta e católica’ (João XXIII, Alocução ao Sínodo Romano, 26-1-1960, AAS, 52, 1960, p. 226).” (nº 37).

– É frequente dizer-se que a imposição do celibato na Igreja católica latina é uma das principais razões para os abusos de menores pelo clero católico, bem como para a falta de vocações sacerdotais na Igreja, como, aliás, Vossa Santidade reconheceu: “Manter o celibato sacerdotal na Igreja causaria, por outro lado, gravíssimo dano onde a escassez numérica do clero, reconhecida e deplorada pelo próprio Concílio Ecuménico Vaticano II, provoca situações dramáticas, impedindo a plena realização do plano divino de salvação, pondo, por vezes, em perigo a própria possibilidade do primeiro anúncio do Evangelho. Muitos, na verdade, julgam que esta grande escassez de sacerdotes provém da obrigação de guardar o celibato” (nº 8).

– Com efeito, o celibato obrigatório afasta muitos católicos do sacerdócio …

“Nosso Senhor Jesus Cristo não hesitou em confiar a um pequeno número de homens, que todos julgariam insuficientes em número e qualidade, a esmagadora missão de evangelizar o mundo então conhecido, e a esse ‘pequeno rebanho’ ordenou que não temesse porque, por Ele e com Ele, graças à sua assistência constante, conseguiria a vitória sobre o mundo. Jesus advertiu-nos ainda que o reino de Deus tem em si mesmo uma força íntima e secreta que lhe permite crescer e chegar à colheita sem que o homem o saiba” (nº 47).

– Mas, essa confiança na providência divina não pode esconder uma certa inércia e grave imprudência em relação às vocações sacerdotais?!

“A messe do reino de Deus é grande e os operários são poucos ainda hoje, como no princípio; nunca foram em número tal que o julgamento dos homens os achasse suficientes. Mas o Senhor do reino manda que se reze para que seja o Senhor da messe a enviar operários para o seu campo. Os projectos e a prudência do homem não podem sobrepor-se à misteriosa sabedoria daquele que na história da salvação desafiou a sabedoria e o poder do homem com a sua loucura e a sua fraqueza” (nº 47).

(*) Todos os textos entre aspas e em itálico procedem da Encíclica SacerdotalisCaelibatus, do Papa São Paulo VI.

Oito mil clientes sem luz por causa dos incêndios

Cerca de oito mil clientes estavam esta sexta-feira, pelas 22h00, sem eletricidade em diversos concelhos do Norte e Centro de Portugal continental atingidos pelos incêndios rurais, informou à Lusa fonte oficial da distribuidora E-Redes.

Segundo a fonte, os concelhos mais afetados hoje por avarias elétricas causadas pelos fogos foram Mêda, Vila Flor, Sernancelhe, Penedono, Moimenta da Beira, Arganil, Oliveira do Hospital, Pinhel, Torre de Moncorvo, Trancoso, Lousã, Góis, Pampilhosa da Serra, Mogadouro e Freixo de Espada à Cinta.

Durante o dia, o número de clientes afetados pelas avarias chegou a atingir os 20 mil, mas à noite, pelas 22h00, a situação encontrava-se “em processo de normalização, com cerca de oito mil clientes ainda sem fornecimento de energia nos locais referidos”, indicou a E-Redes, acrescentando que “tem no terreno” cerca de 150 trabalhadores que, “em estreita colaboração” com a Proteção Civil, “estão a intervir para repor o fornecimento de energia elétrica sempre que as condições o permitem”.

A E-Redes salientou que o encerramento de algumas estradas “tem dificultado o acesso das equipas a determinadas zonas”, criando obstáculos à resolução de algumas avarias.

A mesma fonte adiantou que as equipas da E-Redes e parceiros continuarão no terreno “para avaliar os danos, nas zonas ardidas, e repor a rede quando for possível fazê-lo em condições de segurança”.

“Palestinianismo”, essa doença infantil

O “wokismo” está em queda desde há dois ou três anos. O primeiro prego no caixão foram os severos prejuízos das empresas que apostaram nas maravilhas da “inclusão” e julgaram que insultar dois terços do público era uma hábil estratégia comercial. O segundo prego, praticamente um rebite, foi o regresso de Donald Trump à Casa Branca, tragédia que levou incontáveis derrotados a gritar terapeuticamente para o mar, para o TikTok ou para o psiquiatra. De desfeita em desfeita, a coisa murchou. Começa a tornar-se difícil encontrar um sujeito que fale em “pessoas que menstruam” sem se rir ou sem que riam dele. As “reparações” parecem ruínas de um passado quase tão remoto quanto os absurdos “motivos” das próprias “reparações”. E o respeito pela susceptibilidade de criaturas “micro-agredidas” sumiu em parte incerta. Episódios como o dos jeans/genes da modelo Sidney Sweeney são, desconfio, o estertor de um culto esgotado.

Sucede que o culto, a que podemos chamar esquerda, é perito a esgotar-se e a ressurgir sob novas formas, ao estilo dos percevejos e salamandras. Há décadas que a derrocada da luta de classes força a esquerda a consumir-se e a  renascer sem parança, em busca de trafulhices fresquinhas. Não é tarefa simples. Arranjar alternativas à arcaica defesa dos trabalhadores dá um trabalhão. Felizmente, o trabalho dá frutos: mal um truque é desmontado em praça pública e privada, os “activistas” puxam da cartola outro prontinho a usar. Com as alucinações “woke” nos cuidados intensivos, o truque em voga é o “palestinianismo” – ou o “gazismo”, para poupar nas sílabas.

É escusado explicar a etimologia das palavras. Basta notar que a esquerda está concentrada em afligir-se pela “Palestina”, sobretudo o pedaço da “Palestina” dominado pelo Hamas, e em esconjurar Israel. À semelhança do que acontecia no “identitarismo”, as vítimas continuam a ser instrumentais. A indignação face aos mortos reais e imaginários em Gaza perde um bocadinho de legitimidade quando não se estende a qualquer população ou grupo de facto massacrados por esse mundo afora. Do Sudão do Sul a Moçambique, da Nigéria ao Darfur, da Síria à falecida Birmânia, não há vivalma nas ruas da Europa e da América a protestar as matanças em curso.

A reacção às matanças, portanto, é altamente selectiva: com a excepção de Gaza, onde na verdade há uma guerra, os restantes desgraçados podem morrer livre e impunemente. Porquê? Porque as respectivas mortes não podem ser atribuídas a Israel (mesmo que através de mentiras e “Photoshop” básico), pormenor que só por si garante boa parte da indiferença. O bónus de, na maioria dos casos, as referidas chacinas serem cometidas por muçulmanos assegura a indiferença completa. Conforme o nome indica, o “palestinianismo” não se distrai com minudências.

O “palestinianismo” também não poupa no léxico. Benjamin Netanyahu é nada menos que um “nazi” e os esforços de Israel para eliminar um bando de psicopatas enquanto tenta conter as baixas civis são um “genocídio” comparável ao Holocausto. A lenda do “genocídio”, originada no ministério da Propaganda, perdão, da Saúde do Hamas, e acolhida de braços abertos por 90% dos “media” ocidentais, embate de frente contra uma realidade em que a demografia de Gaza prospera em vez de encolher. Já as comparações com o Holocausto são uma óbvia desvalorização do mesmo e um lamento dissimulado do seu parcial falhanço: se não houvesse sobreviventes à Solução Final, Israel não existiria, um enorme alívio para milhões de “anti-sionistas”, os boçais que desconhecem o significado do termo e os que o usam com pura má-fé.

Embora a ignorância pese bastante, a má-fé é aqui essencial. Em larga medida, a esquerda sabe que Israel é uma democracia e que Gaza é um covil de assassinos. A esquerda sabe dos alertas das IDF e da crueldade dos assassinos para com os locais, dissonantes ou sacrificiais. A esquerda sabe do vergonhoso papel das metástases da ONU e de inúmeros “jornalistas”. A esquerda sabe o que quer dizer “do rio ao mar” e demais juras de extermínio. A esquerda sabe que o conflito no Médio Oriente opõe a civilização que temos à selvajaria, e por isso não hesita em escolher o lado da trincheira. Entre o nosso proverbial “modo de vida” e a sua destruição radical, a esquerda nunca hesitou e não hesitará agora. O “palestinianismo” é apenas a máscara com que hoje a esquerda esconde, muito mal, os recorrentes objectivos de assalto, conquista e aniquilação. Não é a primeira máscara e não será a última.

A novidade é que, ao contrário do “wokismo” e de todos os simulacros de “causas” anteriores, o “palestinianismo” conta com abundantes aliados à “direita”. E o que para a esquerda é principalmente pretexto, para essa “direita” é absolutamente desígnio, e a oportunidade de exercer com à vontade o velho horror ao judeu. Nesta matéria, “skinheads”, fascistas a sério, alguns sociais-democratas e até o ocasional libertário unem-se à esquerda e ao terrorismo islâmico na aversão visceral a Israel. Ao conferir ao seu povo um lugar comum, Israel oferece aos inimigos um propósito partilhado, capaz de mitigar desavenças e apagar contradições. Ao juntar beatos às viúvas de Lenine, o “palestinianismo” é capaz de fenómenos insondáveis. O ódio faz milagres.

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