Museu no Japão dedica exposição ao realizador português Pedro Costa

O Museu de Arte Fotográfica de Tóquio inaugura este mês uma exposição dedicada ao trabalho desenvolvido pelo realizador Pedro Costa nos últimos 25 anos, que inclui filmes, instalações e fotografias.

De acordo com informação disponível no site do museu, a mostra Innervisions estará patente entre 28 de agosto e 7 de dezembro.

O título da exposição remete para o álbum Innervisions, de Stevie Wonder, “que Pedro Costa ouviu na adolescência e que se tornaria uma referência e uma confessada fonte de inspiração”.

“O espírito deste álbum [editado em 1973], que sabe equilibrar a mais genial música moderna popular com o comentário social ressoou profundamente com a práxis cinematográfica de Costa”, lê-se no site do Museu de Arte Fotográfica de Tóquio.

A mostra inclui obras “relacionadas com os personagens, locais e ambientes que têm assumido um papel vital na obra de Costa”, bem como obras do acervo do Museu.

Enquanto Innervisions estiver patente, a sala de cinema do museu irá exibir filmes selecionados por Pedro Costa, bem como uma retrospetiva de obras do realizador.

Os responsáveis do museu consideram que a exposição, “muito especial, mostra e demonstra o poder do cinema e a profundidade do universo cinematográfico de Pedro Costa”.

Segundo informação divulgada esta quinta-feira, “antecipando a abertura da exposição, algumas salas de cinema de Tóquio, Osaka, Nagoya e Kyoto, estrearam as novas versões restauradas de ‘O Sangue ‘, ‘Casa de Lava’ e ‘Ossos’”.

Nascido em Lisboa, em 1959, Pedro Costa é um cineasta independente, herdeiro das experiências feitas em 16mm no documentário pelos seus pares do chamado Novo Cinema, tendo-se formado na Escola Superior de Teatro e Cinema do Instituto Politécnico de Lisboa.

Iniciou a atividade nos anos 1990, tendo sido assistente de realização de Jorge Silva Melo e de João Botelho, tendo criado longas e curtas-metragens como “Vitalina Varela” (2019), “Ne Change Rien” (2009), “Juventude em Marcha” (2006), “Ossos” (1997), “Casa de Lava” (1994) e “O Sangue” (1989).

Aclamado internacionalmente pelos filmes, Pedro Costa é também reconhecido por várias exposições, destacando o Museu de Arte Fotográfica de Tóquio: “Companhia”, que esteve patente em 2018 no Museu de Arte Contemporânea de Serralves, “Le reste est ombre”, com Rui Chafes e Paulo Nozolino, patente em 2023 no Centro Pompidou, em Paris, e “La Canción de Pedro Costa”, que entre 2022 e 2023 percorreu várias regiões de Espanha.

A COP não é para todos: quando se exclui quem também precisa estar na mesa

Os artigos da equipa do PÚBLICO Brasil são escritos na variante da língua portuguesa usada no Brasil.

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A Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas (COP) é, ou deveria ser, o mais importante palco global para avançar a agenda climática. Em 2025, a COP30 será sediada no Brasil, em Belém do Pará, no coração da Amazônia. Mas, antes mesmo de começar, o evento já sofre um abalo grave em sua credibilidade e acessibilidade. A COP30 caminha para se tornar a conferência mais excludente dos últimos anos: uma COP que não é para todos.

O caso mais simbólico até agora é a ausência do presidente da Áustria, Alexander Van der Bellen. Apesar de reconhecer o “grande valor simbólico” de Belém como sede da conferência, o chefe de Estado cancelou sua participação devido aos altos custos logísticos da viagem. A decisão citou a “estrutura orçamentária apertada” da Chancelaria Presidencial. No lugar do presidente, o país será representado pelo ministro do Meio Ambiente, Norbert Totschnig.

A Áustria, uma das economias mais sólidas da Europa, com um PIB de cerca de US$ 540 bilhões, conhecida por políticas ambientais ambiciosas — como seu investimento em energia renovável e mobilidade sustentável — está encontrando barreiras financeiras para enviar sua delegação completa. Se a Áustria está achando caro, o que esperar de países e organizações do Sul Global?

A participação em conferências climáticas como a COP é estratégica para países em desenvolvimento. É ali que se disputam fundos climáticos, se firmam parcerias técnicas e se conquistam espaços de visibilidade para iniciativas locais. Mas os custos elevados para chegar, se hospedar e participar da COP30 em Belém estão tornando o acesso inviável para muitos. E não estamos falando apenas de presidentes e ministros: estamos falando de lideranças indígenas, jovens ativistas, cientistas, mulheres e comunidades que vivem os impactos diretos da crise climática.

O governo brasileiro tem corrido atrás do prejuízo. Nesta semana, o secretário da COP30, Valter Correia da Silva, anunciou que o Brasil pretende solicitar à ONU um aumento nos valores do fundo que subsidia a participação de delegações de 144 países. A justificativa é que a base diária estipulada para Belém está abaixo de 150 dólares — um valor significativamente menor do que o calculado para cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, que têm diárias de referência de 229 e 234 dólares, respectivamente.

Mas esse descompasso era previsível. Belém é, sim, um destino turístico consolidado, que atrai visitantes do Brasil e do exterior, especialmente pela riqueza cultural e ambiental da região. Ainda assim, o nível de planejamento para um evento da escala da COP30 ficou aquém do necessário, mesmo com a cidade tendo sido anunciada como sede ainda em 2023.

Faltando poucos meses para a conferência, obras seguem inacabadas, faltam acomodações adequadas e há relatos de que delegações terão que se hospedar em navios. Esse cenário tem um efeito claro: desencoraja a participação de muitos, especialmente da sociedade civil e de representantes de países do Sul Global, que já enfrentam barreiras logísticas e orçamentárias para estarem presentes.

É comum haver aumento nos preços de hospedagem durante grandes eventos internacionais. Mas o que estamos vendo em Belém vai muito além do razoável: nunca se viu um salto tão vertiginoso nos custos em nenhuma outra edição da COP. Diárias que antes custavam R$ 200 estão sendo anunciadas por mais de R$ 2 mil, quando disponíveis. O impacto é claro: as delegações maiores encolhem, e muitas vozes importantes simplesmente não conseguem participar.

Diante da explosão de preços, o governo federal alega ter pouco controle. Segundo a Casa Civil, há limites legais, pois a legislação brasileira não permite impor tabelamento de preços a hotéis, nem a empresas como Airbnb e Booking. Mas esse argumento, embora juridicamente válido, não justifica a falta de estratégias prévias de contenção e organização — especialmente em um evento com tamanho valor simbólico e político.

E há um risco ainda maior. Em um momento em que o negacionismo climático cresce no cenário global, transformar a COP em um evento inacessível, restrito aos que podem arcar com custos exorbitantes, é um tiro no pé. A conferência pode acabar sendo percebida como um luxo elitista, o que mina sua legitimidade justamente quando mais precisamos ampliar a mobilização global por justiça climática. O fortalecimento da pauta climática exige, acima de tudo, transparência, diversidade e inclusão. Torná-la inacessível alimenta narrativas perigosas que negam sua urgência.

A COP não é (ou não deveria ser) um evento exclusivo para chefes de Estado e CEOs. Ela só cumpre seu propósito se garantir a participação plural de atores da sociedade civil, especialmente aqueles que vivem nas regiões mais afetadas pela emergência climática. A ausência do presidente austríaco é apenas o sintoma mais visível de um problema estrutural: a COP30, do jeito que vem sendo organizada, está se tornando inacessível até para quem tem um papel fundamental nas negociações.

Se quisermos mostrar que o Brasil está de volta ao centro do debate climático global, não basta sediar o evento — é preciso garantir que ele seja justo, inclusivo e acessível. A COP30 ainda pode ser histórica. Mas, para isso, precisa deixar de ser um palco para poucos e se tornar um espaço verdadeiramente coletivo. O tempo e a paciência da comunidade internacional estão se esgotando.

Proposta do Governo quer facilitar e alargar contratos a termo. O que pode mudar?

Entre as mudanças previstas estão o alargamento da duração máxima dos contratos a termo certo e o fim da restrição dos contratos a termo a pequenas e médias empresas. O Governo prepara-se para rever a legislação laboral, propondo um conjunto de alterações significativas nas regras dos contratos a termo, tanto certo como incerto. O anteprojeto, ainda sujeito à aprovação do Parlamento, retoma algumas normas em vigor antes de 2019 e introduz outras novas. Entre as principais mudanças está o alargamento da duração máxima dos contratos a termo certo, que poderá passar dos atuais dois anos para três. Esta alteração recupera

“O maior prejudicado numa guerra comercial é quem a começa”, mas todos vão sofrer

Se os EUA aumentarem a tarifa sobre o Canadá e o México para 25%, a Europa para 15% e a China para 145%, o PIB global poderá contrair 3,38% e o PIB dos EUA até 3,78%, preveem os analistas. O novo plano tarifário dos Estados Unidos que entra em vigor esta quinta-feira, levará, segundo especialistas, a uma inflação mais elevada nos EUA e a um período prolongado de enfraquecimento económico noutras regiões, incluindo a Europa. Os EUA começam a aplicar a partir de quarta-feira o seu novo plano tarifário, que inclui um mínimo global de 10% e impostos a partir

Liga decreta minuto de silêncio em homenagem a Jorge Costa

A Liga Portugal decretou um minuto de silêncio para a jornada inaugural do campeonato em homenagem a Jorge Costa.

O antigo capitão e atual diretor desportivo do FC Porto morreu na terça-feira, vítima de uma paragem cardiorrespiratória.

Depois da Federação Portuguesa de Futebol, também a Liga de Clubes confirmou o momento de homenagem em todos os jogos da primeira e segunda divisão que se disputem entre os dias 8 e 11 de agosto, correspondentes à primeira jornada dos campeonatos.

O presidente da Liga já tinha confirmado à Renascença que o organismo iria “ser sensível” aos pedidos dos dragões, tendo também sido adiado o jogo entre FC Porto e Vitória SC de sábado para segunda-feira.

“Vamos perceber o que é que a comunidade portista vai fazer e a Liga será sensível, tentaremos honrar a memória de Jorge Costa”, afirmou na terça-feira.

O velório de Jorge Costa ocorreu no Estádio do Dragão na quarta-feira e o funeral na manhã desta quinta-feira.

Presidenciais: Indecisão de Sampaio da Nóvoa obriga BE e Livre a ponderar candidaturas próprias

O impasse em torno de António Sampaio da Nóvoa está a obrigar o Livre e o Bloco de Esquerda a considerar candidaturas próprias e os críticos de Seguro no PS a reconsiderar. A cinco meses das eleições presidenciais, o Bloco de Esquerda e o Livre continuam sem um candidato oficial. O nome de António Sampaio da Nóvoa tem sido o preferido dos dois partidos e de uma ala significativa do Partido Socialista (PS), mas a sua hesitação está a gerar crescente frustração entre os partidos que defendem uma candidatura agregadora e independente. Sampaio da Nóvoa, antigo reitor da Universidade de

Sp. Braga vai atacar o Cluj com os olhos no play-off da Liga Europa

O Sporting de Braga defronta esta quinta-feira o Cluj, na Roménia, pelas 19h30 locais (17h30 de Lisboa), na primeira mão da terceira pré-eliminatória da Liga Europa de futebol, com os olhos no play-off de acesso à fase de liga.

Após superar os búlgaros do Levski Sófia na segunda pré-eliminatória, com um empate em reduto alheio (0-0) e um triunfo caseiro, após prolongamento (1-0), o Sporting de Braga reencontra uma equipa que defrontou na edição 2012/13 da Liga dos Campeões.

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Embora o técnico ‘arsenalista’, Carlos Vicens, considere improvável resolver já a eliminatória com o experiente Cluj na Roménia, um triunfo da equipa portuguesa deixa-a mais perto do play-off de acesso à fase de liga da Liga Europa.

Caso supere o Cluj, uma equipa que soma já nove partidas oficiais em 2025/26, com o saldo de três vitórias, três empates e três derrotas, o Sporting de Braga vai defrontar no play-off o Lincoln Red Imps (Gibraltar) ou o Noah (Arménia).

O jogo do Sporting de Braga com o Cluj, na Roménia, relativo à primeira mão da terceira pré-eliminatória da Liga Europa, está agendado para as 19h30 locais (17h30 de Lisboa), e terá a arbitragem de Elchin Masiyev, do Azerbaijão.

Múmia siberiana preservada em gelo ancestral tem tatuagens “verdadeiramente especiais”

A análise das tatuagens da múmia de uma pastora semi-nómada da Idade do Ferro preservada no gelo durante 2000 anos, que não eram visíveis a olho nu, revelou imagens fascinantes: herbívoros caçados por tigres, leopardos e um grifo, e representações de aves — num estilo vívido invulgar. As tatuagens na pré-história eram aparentemente mais comuns do que se pensava. Recentemente, demos notícia no ZAP de uma estranha múmia andina de 800 anos com raras tatuagens faciais. Agora, uma equipa de investigadores analisou uma múmia, preservada no gelo durante mais de 2000 anos, de uma mulher que morreu no século III

“Catástrofe sem precedentes”: França combate o maior incêndio no país desde que há registos. Casas engolidas pelas chamas

Área maior do que Paris ardeu toda no incêndio “mais significativo” desde 1949. Pelo menos 25 casas foram consumidas pelo fogo. O sul de França está neste momento a enfrentar “o incêndio mais significativo” no país desde 1949, segundo o governo do país. O fogo, que lavra na região de Corbières, a norte de Perpignan, já destruiu pelo menos 25 casas, 35 veículos e consumiu milhares de hectares de vegetação. Mais de 16 mil hectares arderam, segundo a France 24, que nota que os responsáveis pelo combate às chamas classificam o fogo como “gigantesco“. Uma mulher de 65 anos perdeu

Quer o seu vinho com ou sem bâtonnage?

Primeiro, foi a barrica, com os produtores e enólogos a querer reduzir a presença de madeira nova nos seus vinhos; depois, a vindima precoce, em busca de acidez e menos álcool; agora, é a bâtonnage que os técnicos querem controlar. É o vinho a fugir das receitas-padrão. A conversa sobre fim da bâtonnage é exagerada, mas lá que começa a dar que falar no meio onde circulam produtores, críticos de vinhos, sommeliers e a classe dos enochatos (o mundo não é um mar de rosas), lá isso dá. Atenção que não vamos aqui atirar pedras a quem faz bâtonnage. Isso seria ridículo. Vamos é perceber se esta técnica contribui ou não para uma certa padronização de perfil dos vinhos brancos portugueses. Melhor dito, vamos questionar se a bâtonnage — aliada à barrica nova e à fermentação maloláctica — faz sentido.

A bâtonnage é uma técnica que consiste em agitar as borras finas presentes no fundo de uma barrica ou de num depósito de inox para que, em contacto com o vinho e por via de determinadas reacções químicas que não vamos agora desenvolver, acrescentem maior volume de boca, textura sedosa, sabores peculiares (as famosas notas de manteiga), alguns aromas também eles lácteos e — muito importante — protecção contra a oxidação do vinho ao longo do tempo. Como a agitação se popularizou em França por via de um bastão que se introduzia na barrica (bâton), ficou conhecida a nível mundial como bâtonnage, embora a técnica já fosse praticada no tempo dos romanos.

Durante o evento de lançamento em Portugal da distribuidora brasileira Clarets, cujo portfólio é sustentado com vinhos de nicho de produtores franceses menos badalados, o sommelier de serviço, Pedro Ramos, terminava a apresentação de cada vinho (e foram muitos) nos seguintes termos: “com bâtonnage” ou “sem bâtonnage. Quando o jantar caminhava para o fim, Pedro Ramos (brasileiro e conhecido no meio como Pedrones) adaptou o discurso desta forma: “Este produtor não brinca de bâtonnage.” Portanto, é plausível que, de agora em diante, os consumidores venham a ser confrontados com esta conversa de vinho ou sem bâtonnage.

A bâtonnage começou a ser prática regular em Portugal para os vinhos brancos a partir do processo de modernização recente do sector, que se iniciou nos anos 80 do século passado. A ideia de tornar os vinhos brancos mais volumosos, sedosos e longevos tanto se destinava ao mercado interno (desconhecedor deste perfil de vinhos) como aos mercados externos, onde era preciso competir por imitação de práticas francesas que faziam escola em todo o mundo.

A agitação de borras finas popularizou-se em França por via de um bastão que se introduzia na barrica (bâton) e por essa razão ficou conhecida a nível mundial como bâtonnage
Adriano Miranda / Arquivo do PÚBLICO

Sucede que, associado à bâtonnage, estava o uso de barricas de fermentação e estágio (barricas de carvalho novas de 225 litros) e a prática das fermentações malolácticas (transformação do ácido málico em ácido láctico), que tinham por objectivo tornar os vinhos menos ácidos, mais aveludados, mais estáveis e, no prolongamento da bâtonnage, reforçar as tais notas de manteiga e pastelaria.

Vinhos fotocópia

Se a fermentação em barrica, a bâtonnage e a fermentação maloláctica são técnicas que podem funcionar separadamente (e há quem pratique o método), usá-las todas para a produção de um vinho passou a ser, para muitos produtores, uma receita-padrão do Douro, no Alentejo, no Tejo, em Lisboa ou Setúbal, estivéssemos perante um vinho da casta Arinto (ácida) ou da casta Fernão Pires (pouco ácida).

E o que é que resultou desta prática? O lançamento de vinhos muito aproximados em termos de perfil e, nalguns casos, aquilo a que chamamos vinhos fotocópia. Pior ainda, tais vinhos, em prova cega, tinham — ainda têm — uma incapacidade acentuada para expressarem a sua região de origem, coisa que atenta contra o espírito do conceito de denominação de origem protegida (DOP). Muito pior ainda, a partir de um segundo copo, estes vinhos — que viram o álcool crescer ao longo do tempo — tornavam-se enjoativamente adocicados, amanteigados, chatos e pouco gastronómicos. Dirk Niepoort arranjou-lhes um nome perfeito: “Vinhos pesadelo.”

Claro que uma coisa é o efeito destes vinhos-padrão em enófilos preocupados com o conceito de terroir e outra é o comportamento da generalidade dos consumidores que bebem vinho como quem bebe refrigerantes e que ficam aborrecidos se alguém lhes mudar de perfil em função dos anos climáticos. Para estes, a barrica nova e de pequeno formato, leveduras científicas e internacionais, a bâtonnage e fermentações alcoólicas garantem um padrão imutável, seguro e descomplicado. Em rigor, são estes consumidores que pagam as contas das adegas.

Ora, tanto se extremou este comportamento padronizado que alguns produtores se viram obrigados a abandonar a receita, procurando substituir protocolos por práticas que valorizem o carácter regional e identitários dos seus vinhos.

Enólogo em diferentes projectos entre a Bairrada, o Dão e o Douro, Paulo Nunes diz-nos que sempre fugiu às notas de manteiga “pelo facto de tornarem os vinhos parecidos uns com os outros”, pelo que a bâtonnage é técnica que não pratica de todo. “Quanto à fermentação maloláctica — e no caso da Casa da Passarela —, não me preocupo muito. Para uma mesma colheita que está em diferentes barricas, o que acontece é que numas a maloláctica ocorre e noutras não. No final, faço o lote com os vinhos neste estado e encontro o equilíbrio que quero.”

Mas, quanto à estabilidade dos vinhos no tempo, a bâtonnage é ou não importante? Responde Paulo Nunes: “Em vez de deixar o vinho nas borras finas e andar a levantá-las de 15 em 15 dias, prefiro deixar o vinho sobre as borras totais e arriscar um certo efeito redutor no vinho — aromas potencialmente desagradáveis — que, com o tempo (dois ou três anos), me vão melhorar a capacidade evolutiva dos meus vinhos. Prefiro arriscar inicialmente para ganhar mais à frente e nunca ter vinhos a cheirar manteiga. Até porque a bâtonnage promove uma evolução estanque e em bloco dos vinhos, enquanto a redução me dá a evolução natural que desejo num vinho”.

Recordando que a bâtonnage e a fermentação maloláctica fazem sentido na Borgonha, onde vinhos da casta Chardonnay têm níveis de acidez muito elevados (não é o que se passa em todas as regiões), o enólogo da Passarela realça que tais técnicas — assim como a utilização de leveduras de fermentação universais ou o véu nas barricas (película de leveduras que cobre o vinho) — têm a capacidade de anular a casta, o solo e o clima onde nascem os vinhos.

Barricas de grande formato

Pela mesma bitola anda Bernardo Cabral (Vicentino, Picowines, Murga e outros vinhos), que, em vez de se preocupar com a bâtonnage, prefere o trabalho do vinho nas barricas de grande formato ou, preferencialmente, em balseiros. “Eu pratico cada vez menos a bâtonnage. Numa primeira fase, um mês, posso dar alguma ‘porrada’ no vinho, mas depois deixo-o estar sossegado nas borras. A bâtonnage dá volume e estabilidade aos vinhos, isso é certo, mas eu procuro as condições para isso no trabalho de viticultura e no volume das barricas. Notas minerais e de pólvora eu gosto, amanteigados, não. Por exemplo, por que raio haveria eu de querer sabores lácteos num vinho do Pico? Isso não faz sentido. O que eu quero é que o vinho realce a salinidade e a mineralidade do basalto. Ponto.”

Enólogo e professor na Bairrada, José Carvalheira reconhece que hoje há uma “notória procura por vinhos mais frescos e elegantes, pelo que a acidez é um factor determinante”, mas defende que “o levantamento das borras é importante para a estabilidade e longevidade do vinho. As borras — ou seja, as leveduras mortas em suspensão — têm de facto um efeito antioxidante. Imagine um cenário em que coloco um mesmo vinho acabado de fermentar em duas cubas separadas. No vinho da cuba A eu faço bâtonnage de 15 em 15 dias; no vinho da cuba B eu não faço bâtonnage alguma. Pois eu garanto-lhe que este último, ao fim de um ano, vai parecer um vinho com um ano, enquanto o vinho A vai parecer um vinho com seis meses de vida — um vinho bastante mais jovem. Aliás, não nos esqueçamos de que, em Champagne, todos os vinhos-base passam pela técnica da bâtonnage, em especial aqueles que servirão para a produção de champanhes de assemblage (vinhos com diferentes colheitas numa mesma garrafa)”.

Dito isto, José Carvalheira é um praticante moderado da bâtonnage, assim como um defensor acérrimo da identidade territorial dos vinhos. “Um dos nossos problemas é andarmos sempre a imitar o que os outros fazem nas regiões clássicas, aquelas que, como as regiões francesas, não se interessam muito pelos conceitos de tendências e de modas.”

Em vez de se preocupar com a bâtonnage, Bernardo Cabral prefere o trabalho do vinho nas barricas de grande formato Nuno Ferreira Santos / Arquivo do PÚBLICO
Paulo Nunes diz-nos que sempre fugiu às notas de manteiga, pelo que a bâtonnage é técnica que não pratica de todo
Manuel Roberto / Arquivo do PÚBLICO

Para rematar, Diogo Lopes (AdegaMãe, Herdade Grande, Kranemam ou Quinta dos Frades) salienta que “é ridículo usar-se a bâtonnage à laia das regras do HCCP [em português traduzimos por Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo]”. “Mas não nos podemos esquecer de que todos os grandes brancos do mundo fazem bâtonnage, porque isso dá elegância aos vinhos. Se eu quero que os meus vinhos brancos se destaquem pela bâtonnage? Claro que não. Eu, enquanto enólogo, não posso é ser radical. Tenho de afinar a técnica da bâtonnage região e região e casta a casta, sendo certo que não pratico, num mesmo vinho, bâtonnage e fermentação maloláctica. Isso não.”

Moral da história, precisamos de mais bom senso e menos imitações; mais identidade e menos cosmopolitismo vínico; maior arrojo e menor seguidismo. Em nome do carácter dos diferentes perfis dos vinhos brancos portugueses. É um bocadinho como dizia sobre o Oscar Wilde sobre outras matérias: “Sê tu próprio, todos os outros já existem.”

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