Gestor demitiu-se da TAP porque não tinha seguro e contrato público, Pedro Nuno e Leão invocaram razões pessoais

Gestor demitiu-se da TAP porque não tinha seguro e contrato público, Pedro Nuno e Leão invocaram razões pessoais

Esteve na TAP apenas por três meses, de onde saiu em outubro de 2021, por “motivos pessoais imprevisíveis”, segundo foi anunciado na altura por Pedro Nuno Santos e João Leão, os ministros da tutela na altura. Porém, sabe-se agora em maio de 2023, que tal renúncia teve justificação profissional: a discordância de João Weber Gameiro com as suas condições de trabalho, desde logo a não existência de um contrato de gestão para o exercício de funções de gestor público (obrigatório por lei, mas que não havia na TAP), e de um seguro para gestores com capital suficiente.

Na sua audição esta quinta-feira, 25 de maio, Weber Gameiro defendeu que aquelas eram “duas peças fundamentais” para administrar a TAP. João Weber Gameiro, que ocupou o cargo de diretor financeiro, entrou e saiu da TAP rapidamente. Esteve no cargo cerca de três meses, mais 15 dias de passagem de pasta e mais 15 dias de funções não executivas.

Segundo explicou, o contrato de gestão – que define quais os objetivos e metas, e eventuais prémios correspondentes – não estava assinado e o presidente da administração, Manuel Beja, desvalorizou com o facto de haver outras empresas públicas nessa situação. Na verdade, só a partir do fim do ano passado é que os contratos de gestão (que são obrigatórios à luz do Estatuto do Gestor Público) começaram a ser feitos no sector empresarial do Estado.

“Sabia da necessidade de serem celebrados contratos de gestão. Eu próprio levantei essa questão quando estávamos a findar o período de três meses. Porque perguntei. Caso não haja contrato de gestão, há risco de nulidade. Não estava preocupado com nulidade, mais com a eficácia do que eu assinasse”, justificou aos deputados.

Seguro era fundamental

Além disso, Weber Gameiro também sublinhou o nível de responsabilidades exigido a gestores de uma companhia aérea como a TAP, pelo que era preciso um seguro que os protegesse. “Para mim, era importante ter contrato de gestão, assim com seguro de directors and officers (D&O)”, disse. Antes havia, mas o que estava disponível era “diminuto”, “passou a ser muito difícil encontrar no mercado uma seguradora disponível a segurar a TAP”.

“As responsabilidades que podem advir para um administrador podem ser muito elevados, e não tem que ver com o seu salário, tem que ver inclusive com a sua própria situação. Imagine ter uma incidência sobre a lei de Nova Iorque, e que tem de contratar um advogado para o defender. São processos que exigem especialistas. Se estes seguros existem e se as empresas os usam, não é para serem generosas com os gestores”, explicou-se o antigo administrador da companhia aérea, que antes da TAP fez carreira na banca, inclusive no BBVA

TIAGO MIRANDA

“Para o Governo foram motivos pessoais”

“Lamentando que, por motivos pessoais imprevisíveis, a colaboração na gestão da TAP tenha sido interrompida, os ministros de Estado e das Finanças, João Leão, e das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, agradecem o trabalho desenvolvido por João Weber Gameiro”, era o que estava inscrito no comunicado emitido pelos dois ministérios a 1 de outubro de 2021.

“Na perspetiva do ministro das Finanças ou do Governo, eu teria condições e deveria ter continuado e tudo fizeram no sentido de me apoiar e estimular nesse caminho. No entanto, na minha consciência face ao que apresentei, entendi que não tinha condições”; respondeu. E, embora não tenha sido ele a escrever o comunicado do Governo, Weber Gameiro não valoriza o que lá está escrito: “Para o Governo foram motivos pessoais, porque são decisão minha, e imprevisíveis, porque não contavam com isso”.

Explicações que os deputados foram questionando ao longo da audição. Leão e Pedro Nuno terão oportunidade de explicar as suas versões na CPI à TAP, nas audições agendadas para dia 6 e 15 de junho, respetivamente, sendo que dia 6 o ex-ministro das Infraestruturas também irá à comissão de economia. Mais explicações a dar a juntar às divergências que iam mantendo na tutela da empresa (que se mantiveram quando Fernando Medina substituiu João Leão).

E é mais um comunicado em torno da TAP cuja veracidade é questionada posteriormente, como o que referia a demissão de Alexandra Reis em janeiro de 2022, que falava em renúncia por decisão própria, e acabou depois por saber-se que foi por iniciativa da companhia aérea.

Tendo assumido a administração financeira da TAP quando Christine Ourmières-Widener passou a presidente executiva, e encontrando Alexandra Reis já na administração, João Gameiro explicou que não assistiu “a nenhuma situação de conflito ou pré-conflito”.

Uma das divergências que separou a antiga CEO e a ex-gestora foi a sede: a primeira queria mudar a sede da TAP, atualmente perto do Aeroporto de Lisboa, a segunda preferia manter. João Weber Gameiro admitiu que este era um tema em discussão.

Na sua opinião, a sede está “numa situação muito debilitada”, num “estado muito agravado”. “O reduto TAP [conjunto de edifícios] está dado como colateral, e a Eng.ª Alexandra Reis fez apresentações de valorização e rentabilização de parte do património, edifícios que não estão ocupados. Eu próprio questionei por que não vendemos. Não havia compradora”, explicava Alexandra Reis, segundo cita o seu antigo colega de administração.

(notícia atualizada com mais informações pelas 18h20)